TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

83 acórdão n.º 242/18 Não é, portanto, apenas um critério económico aquele que está na base da opção tomada pelo legisla- dor de concessão, ou não, de proteção jurídica (nas suas diversas modalidades) às pessoas coletivas. Há que conjugá-lo com um critério de interesse público ou geral na concessão de um apoio de valor económico que onera toda a comunidade. Importa, assim, ponderar todos os interesses em presença o que não dispensa a análise de todo o regime legal instituído, designadamente em sede de recuperação de empresas em situação de insuficiência económica. Na ponderação dos interesses em presença feita pelo legislador, no âmbito da sua liberdade de con- formação na concretização prática do conceito de insuficiência económica para efeito do apoio judiciário, não se ignorou que, diferentemente das pessoas coletivas com escopo lucrativo, as pessoas coletivas sem fins lucrativos têm subjacente a prossecução de um interesse geral ou mesmo altruístico. Essa será a razão pela qual apenas estas deverão poder beneficiar de apoio judiciário, justificando que se onere toda a comunidade com as despesas inerentes à defesa dos seus direitos em tribunal, desde que se prove a sua insuficiência econó- mica. Em conformidade, exclui-se da proteção jurídica apenas as sociedades comerciais ou constituídas em forma comercial (para além dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada os quais, de todo o modo, não foram abrangidos pela decisão do acórdão de generalização) que tenham por função caracte- rizadora a obtenção de lucros económicos a distribuir pelos seus sócios. Uma tal solução assenta, portanto, na distinção entre pessoas coletivas com fins lucrativos e pessoas coletivas sem fins lucrativos, o que significa que o critério legal de concessão do referido benefício se centra na finalidade estatutária da pessoa coletiva. 3. Não me parece que uma tal opção, por si só, possa merecer censura constitucional. Existe um fundamento material bastante para que o legislador limite o apoio que concede às pessoas coletivas com fins lucrativos em matéria de acesso ao direito e aos tribunais. Desde logo, aquela limitação encontra justificação na circunstância de os custos com a litigância decorrente da própria vida comercial normal das empresas e o seu escopo lucrativo serem integrados na planificação da atividade empresarial nor- mal e ulteriormente repercutidos no preço final dos bens e serviços fornecidos ao consumidor. Acresce que os custos derivados de contencioso podem ser deduzidos aos rendimentos das pessoas coletivas para efeitos tributários. Assim, a impossibilidade de suportar os custos com litígios, designadamente os decorrentes da própria vida comercial da pessoa coletiva evidencia o perigo da inviabilidade económica da empresa e, no limite, a própria inviabilidade (falência) da pessoa jurídica cuja constituição – é conveniente não esquecer – se justi- fica apenas para o exercício dessa atividade empresarial. É, portanto, a própria natureza das coisas que impõe que as pessoas coletivas instituídas para a realização de uma atividade económica destinada à obtenção de lucros devam encontrar-se dotadas de uma estrutura organizativa e financeira capaz de fazer face aos custos previsíveis da sua atividade, incluindo os que resultem da litigiosidade normal que a gestão comercial frequentemente implica. 4. Para além disso, é também preciso tomar em devida conta que o legislador não deixou as pessoas cole- tivas com fins lucrativos totalmente desprotegidas no que respeita a despesas com a defesa dos seus direitos e o acesso aos tribunais. A alínea u) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais isenta de custas «As sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabili- dade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho». As dificuldades económicas das pessoas coletivas com fim lucrativo relevam, por conseguinte, no seio do Pro- cesso Especial de Revitalização (PER) instituído pela Lei n.º 16/2012, de 20 de abril, que alterou o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE). E é razoável que assim seja dada a convergência de sen- tido útil da proteção jurídica (isenção ou redução, total ou parcial, de custas) e o fim do processo especial da revitalização da empresa o qual se destina a facultar aos devedores em situação económica difícil ou em

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