TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
723 acórdão n.º 374/18 «A Assembleia da República, em reapreciação do regime jurídico relativo à fiscalização das contas dos partidos e das campanhas eleitorais, concluiu que o mesmo carece de alterações de modo a superar dúvidas de inconstitu- cionalidade dos procedimentos. No essencial, importa assegurar que a entidade responsável pela fase de avaliação de prestação de contas não seja a mesma que julga das eventuais irregularidades. Tal como há que garantir que a entidade que decide não seja a mesma que aprecia em sede de recurso, assim se acautelando o princípio da separação de poderes. Neste sentido, a principal novidade introduzida pela presente alteração legislativa prende-se com a atribuição à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos da competência para investigar as irregularidades e ilegalidades das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, bem como aplicar, sendo caso disso, as respetivas coimas, com a possibilidade de recurso, com efeitos suspensivos, para o Tribunal Constitucional que decide em plenário. As demais são alterações pontuais cuja introdução se revelou necessária.» O mesmo resulta da discussão da generalidade. Pela voz dos Deputados José Silvano, Jorge Lacão, Pedro Soares, António Filipe, José Luís Ferreira e António Carlos Monteiro, em nome, respetivamente dos grupos parlamentares do PSD, PS, BE, PCP, Os Verdes e CDS-PP, foi invocado o consenso gerado em torno da necessidade de superar dúvidas de constitucionalidade que incidiam sobre o processo relativo à fiscalização das contas dos partidos políticos e campanhas eleitorais, de modo a assegurar que, doravante, «a entidade res- ponsável pela fase de avaliação das contas não seja a mesma entidade que julga as eventuais irregularidades» ( Diário da Assembleia da República, I Série n.º 30/XIII/3, de 22 de dezembro de 2017, pp. 11-14; p. 13). Ademais, na sequência da aprovação do referido Projeto-Lei e da sua não promulgação pelo Presidente da República (por razões que se prendem com o financiamento dos partidos políticos, e não com as altera- ções ao regime de fiscalização de contas) veio a iniciativa legislativa a ser reapreciada em reunião plenária, sendo objeto de alterações pontuais (sem relevo para a presente análise) e novamente aprovada. Mais uma vez, emerge com nitidez da discussão que o respeito do sistema normativo pelo princípio da acu- satório na vertente sancionatória, garantindo que oTribunal Constitucional não mais seja a entidade competente para a fase de avaliação da prestação de contas e para o julgamento das eventuais irregularidades e ilegalidade detetadas, foi o vetor principal a nortear a medida legislativa, visando a norma transitória a aplicação desse novo regime aos processos pendentes, tanto na Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, como no Tribunal Constitucional ( Diário da Assembleia da República , I Série, n.º 55/XIII/3, de 3 de março de 2018, pp. 3-30). 8. Sendo essa a ratio legis , fica claro que a reforma da fiscalização das contas anuais dos Partidos Políticos (e das campanhas eleitorais) operada em 2018 incide fundamentalmente no procedimento contraordenacional e obedece ao propósito de erradicar as dúvidas aludidas por meio da substituição do modelo de dupla pronúncia do Tribunal Constitucional por outro, que reconduza o bloco normativo que enquadra o sistema de fiscalização das contas partidárias (e das campanhas eleitorais) ao modelo do regime contraordenacional geral. A esta luz, estando o impulso legislativo tão fortemente arrimado à identificação de dúvidas de inconsti- tucionalidade, mal se compreenderia a introdução de norma transitória que comportasse o efeito de manter a aplicação da Lei Velha aos processos pendentes em que não se consumara o julgamento de mérito da pro- moção deduzida do Ministério Público. Uma tal aporia – que leva no seu seio a aceitação do irremediável arquivamento de todos os processos de fiscalização de contas em caso de emissão do juízo de inconstitucionalidade por este Tribunal das normas que definem, na LTC, LFP e LEC, a competência para julgamento do Tribunal Constitucional ( i. e. as normas dos artigos 103.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, 32.º, n.º 4, e 34.º da LEC, e 28.º e seguintes da LFP), como que criando um buraco negro no sistema de fiscalização das contas partidária – não pode ser aceite, por claramente contrária à vontade do legislador parlamentar. Outrossim, por sólida e cabalmente suportada nos trabalhos preparatórios, e com pleno arrimo no texto da lei, impõe-se a leitura de que o preceituado no artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2018, procura consagrar
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