TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
706 Como se observou no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/04, o legislador constitucional, tal como o legislador ordinário, rodeou de especiais cautelas a intervenção jurisdicional destinada a garantir a observância dos princípios organizatórios e procedimentais da democracia política, pretendendo evitar que, por essa forma, se pudesse vir a exercer um controlo sobre a atividade política dos partidos e, de algum modo, limitar a liberdade de organização da vontade popular, e por isso se circunscreveu os meios processuais de impugnação das delibera- ções dos órgãos de partidários àquelas que fossem consideradas «mais importantes para assegurar os princípios da organização e gestão democráticas dos partidos políticos, sem, por outro lado, judicializar a respetiva vida interna, correndo o risco de tolher a sua liberdade de ação política e o seu espaço de afirmação, interna e externamente». 5. Neste contexto interpretativo, nada permite concluir, contrariamente ao que defende o recorrente, que a ação de impugnação de eleição a que se refere o artigo 103.º-C da LTC possa abranger, não apenas a validade e regularidade do ato eleitoral, mas também o ato decisório do órgão partidário que em última instância se tenha pronunciado sobre a omissão ou inclusão de militantes nos cadernos eleitorais, quando é certo que esse corres- ponde apenas a um ato intermédio ou intercalar que, quando muito, pode afetar a regularidade do procedimento e inquinar a decisão final que tenha fixado os resultados eleitorais. Certo é que o n.º 1 do artigo 103.º-C da LTC alude à possibilidade de a ação de impugnação de eleição ser instaurada, quanto à omissão nos cadernos ou listas eleitorais, também pelos militantes cuja inscrição seja omitida; mas isso apenas evidencia um critério de legitimidade ativa no tocante à propositura da ação, significando que aquele que tenha sido impedido de votar por indevida omissão ou exclusão dos cadernos eleitorais possa igual- mente impugnar o ato eleitoral”. Constitui, portanto, jurisprudência constitucional consolidada o entendimento de que, nos termos do artigo 103.º-C da LTC, apenas é impugnável, autonomamente, o ato final do procedimento eleitoral – em regra, o próprio ato eleitoral – sendo no contexto dessa impugnação que haverá lugar à sindicância da validade dos atos intercalares desse procedimento (também reiterando este entendimento cfr. o Acórdão n.º 145/13). No caso aqui em apreciação, o recorrente começou por circunscrever o objeto do seu inconformismo apenas à decisão da Mesa do Congresso de não admissão da lista em que figurava como candidato (ato inter- locutório), sem impugnação do ato final de eleição, no qual não esteve sequer presente, dado que optou por abandonar os trabalhos do Congresso. Ora, para que esteja aberta a via de impugnação de eleição de titulares de órgãos de Partidos Políticos para o Tribunal Constitucional, é ainda necessário respeitar o requisito previsto no artigo 103.º-C da LTC, que demanda o esgotamento prévio de todos os meios internos a quem se encontra acometida a apreciação da validade e regularidade do ato eleitoral. Na verdade, o acesso ao Tribunal Constitucional “só é admissível depois de esgotados todos os meios internos previstos nos estatutos para apreciação da validade e regulari- dade” da deliberação (vide, entre outros, Miguel Prata Roque, “O Controlo Jurisdicional da Democratici- dade Interna dos Partidos Políticos”, in AA.VV ., Tribunal Constitucional, 35.º Aniversário da Constituição de 1976, vol. II, Coimbra Editora, 2012, pp. 281-342 e ainda Carla Amado Gomes, “Quem tem Medo do Tribunal Constitucional?, A Propósito dos Artigos 103.º-C, 103.º-D, e 103.º-E da LOTC”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, 2003, Coimbra Editora) . Nos termos do artigo 7.º do Regimento do Congresso Federativo (fls. 154 e seguintes dos autos), «A Mesa assegura a direção dos trabalhos, só podendo as suas decisões ser impugnadas por recurso ao Plenário do Congresso». E, acrescenta o artigo 14.º, n.º 1, do mesmo Regimento que «Do resultado da votação para a eleição dos órgãos da Federação, poderá haver recurso para o Plenário do Congresso, logo após a sua divul- gação pela Mesa. Por sua vez, o artigo 14.º, n.º 2, afirma que «O resultado da eleição dos órgãos da federação após ser comunicado pela Mesa, e não sendo impugnado, torna-se definitivo». Contudo, o impugnante não contrariou a deliberação da Mesa nos termos acima estatuídos e, ainda menos, o resultado da eleição dos órgãos, dado que optou por abandonar o congresso e apenas após a sua conclusão e o encerramento dos trabalhos questionou a decisão da Mesa – já não para o Plenário do
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