TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
694 Não é, pois, de dispensar o cumprimento do ónus de suscitação atempada deste problema quando a interpretação normativa questionada corresponde a uma das interpretações possíveis – ou porventura prová- vel – do citado quadro normativo, a qual se apresenta como inteiramente compatível com o teor literal do preceito em causa ou quando a norma questionada foi aplicada no seu sentido literal. Por isso, não sendo tal ónus dispensável in casu , impõe-se concluir que não ocorreu a suscitação de inconstitucionalidade da norma sindicada durante o processo, pelo que a recorrente carece de legitimidade recursória [cfr. os artigos 70.º, n.º 1, alínea b) , e 72.º, n.º 2, da LTC]. Falha, por isso, um dos pressupostos necessários ao conhecimento do objeto do recurso. III – Decisão Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação apresentada e condenar a reclamante nas custas, fixando- -se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (cfr. o artigo 7.º do mesmo diploma). Lisboa, 7 de junho de 2018. – Pedro Machete – Fernando Vaz Ventura – Catarina Sarmento e Castro – Maria Clara Sottomayor (vencida de acordo com declaração que junta) – Manuel da Costa Andrade. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Voto vencida, por entender que, neste caso, o recurso de constitucionalidade devia ter sido admitido e deferida a reclamação da recorrente. 2. Entendeu o acórdão, que fez vencimento, que a reclamação do despacho que não admitiu o recurso de constitucionalidade tinha de ser indeferida, por não ter a questão da constitucionalidade da norma constante do artigo 425.º, n.º 5, do CPP, sido objeto de suscitação prévia durante o processo, designadamente nas alegações de recurso dirigidas ao tribunal recorrido, faltando, em consequência, o requisito da legitimidade para interpor recurso de constitucionalidade, nos termos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC. 3. Ora, segundo jurisprudência do Tribunal Constitucional, nomeadamente, os Acórdãos n. os 151/99 e 709/98, a possibilidade de adoção na decisão de recurso, pelo tribunal recorrido, da forma “sumária” de fundamentação e julgamento, constitui uma vicissitude processual não previsível para as partes, admitindo- -se o recurso de constitucionalidade das normas de processo civil que permitem esta forma de julgamento, por se entender não ser exigível o preenchimento, nesta hipótese, do ónus de suscitação prévia da questão de constitucionalidade. No mesmo sentido, vide Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, 2010, p. 80. 4. Embora no caso vertente, se trate de uma norma de processo penal, a situação substancialmente é a mesma, pois o tribunal recorrido decidiu por remissão para a decisão recorrida, sem fundamentação própria, nos termos do artigo 425.º, n.º 5, do CPP, segundo o qual «Os acórdãos absolutórios enunciados na alínea d) do n.º 1 do artigo 400.º, que confirmem decisão de 1.ª instância sem qualquer declaração de voto, podem limitar-se a negar provimento ao recurso, remetendo para os fundamentos da decisão impugnada». 5. Ora, tendo o recorrente (e também o Ministério Público) impugnado a decisão proferida sobre a matéria de facto, que exige dos tribunais audição da prova e reavaliação da mesma, não era de todo previsível
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