TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

653 acórdão n.º 394/18 Em síntese: de forma estável e reiterada, tem este Tribunal entendido que, cabendo na competência reservada da Assembleia da República – ou excecionalmente do Governo, caso para tal lhe seja especifica- mente concedida habilitação – legislar sobre o regime geral do ilícito de mera ordenação social [cfr. artigo 165.º, n.º 1, alínea d) , da Constituição], tem permissão o Governo para, no exercício da sua competência legislativa concorrente e sem com isso extravasar os limites do regime, modificar ou eliminar contraordena- ções já existentes e modelar regras secundárias do processo contraordenacional. Uma vez que, conforme apontado já, a regra do efeito suspensivo da impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória integra, como um dos seus elementos essenciais, o regime geral das contraor- denações, a inversão operada pela norma sindicada não pode deixar de constituir uma alteração substancial daquele regime, pelo que somente a Assembleia da República (ou excecionalmente ao Governo, desde que munido de uma autorização legislativa suficiente), teria competência para a editar. Pese embora o Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, que aprovou o EERS, tenha sido aprovado ao abrigo do disposto no artigo 3.º da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o certo é que, não constituindo a Lei n.º 67/2013 credencial normativa bastante para o efeito, será forçoso concluir que a norma do n.º 5 do artigo 67.º dos EERS, com o sentido aplicado pelo tribunal a quo, é também organicamente inconstitucional por violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. III – Decisão Em face do exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional a norma constante do n.º 5 do artigo 67.º dos Estatutos da Entidade Regu- ladora da Saúde, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, com o sentido de que o recurso que visa a impugnação judicial das decisões finais condenatórias da Entidade Reguladora da Saúde em processos contraordenacionais tem, por regra, efeito meramente devolutivo, ficando a atribuição de efeito suspensivo subordinada à prestação de caução e à verificação de um prejuízo considerável para o recorrente decorrente da execução da decisão, por violação das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa; e, em consequência, b) Julgar improcedente o recurso interposto pelo recorrente confirmando-se a decisão recorrida, ainda que com fundamentação diversa, nos termos constantes na parte final do artigo 79.º-C da LTC. Sem custas judiciais, por não serem legalmente devidas. Lisboa, 11 de julho de 2018. – Joana Fernandes Costa – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Maria José Rangel de Mesquita (com declaração) – Lino Rodrigues Ribeiro – João Pedro Caupers. DECLARAÇÃO DE VOTO Acompanha-se o julgamento de inconstitucionalidade orgânica da norma sindicada constante da alínea a) da Decisão (e respetiva fundamentação, cfr. n. os 7 a 12), com fundamento, apenas, na violação da alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição – reponderando o alcance da posição expressa na declaração de voto (1.º parágrafo, 1.ª parte) aposta ao Acórdão n.º 728/17, desta 3.ª Seção, no sentido de a admissi- bilidade do exercício da competência legislativa concorrente no domínio em causa (matéria contraordena- cional) não comportar, como decorre do presente Acórdão, a inversão da regra-geral do efeito (suspensivo)

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