TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

651 acórdão n.º 394/18 Neste sentido aponta claramente a jurisprudência deste Tribunal, conforme pode comprovar-se, a título ilustrativo, pela síntese constante do Acórdão n.º 339/08: “O artigo 181.º, do Código da Estrada, incluindo o seu n.º 4, regula o conteúdo obrigatório da decisão admi- nistrativa condenatória em matéria de contraordenações estradais, integrando, pois, o âmbito do direito processual contraordenacional. Na alínea d) , do n.º 1, do artigo 165.º, da CRP, incluiu-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, o regime geral de punição dos atos ilícitos de mera ordenação social e do respetivo pro- cesso. (…) No artigo 58.º deste diploma enunciou-se o conteúdo obrigatório da decisão administrativa condenatória, nomeadamente a necessidade da mesma conter a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas [n.º 1, b) ]. Uma vez que esta exigência visa garantir os direitos de defesa do acoimado, designadamente a possibilidade efetiva de impugnação judicial da decisão administrativa, entende-se que tal norma se insere no mencionado regime geral, cuja competência legislativa está reservada à Assembleia da República, não podendo, pois, a mesma ser alterada por diploma emanado do Governo, sem autorização parlamentar (vide, neste sentido, o acima citado Acórdão n.º 62/03). Mas esta exigência de conteúdo não se estende à forma pela qual ela deve ser cumprida, desde que a forma escolhida não ponha em causa as finalidades visadas com essa exigência – a possibilidade do acoimado conhecer quais os factos por cuja prática lhe foi aplicada a coima e as respetivas provas. A fundamentação mencionada na alínea b) , do n.º 1, deste artigo diz respeito “à descrição sumária dos factos, das provas e das circunstâncias relevantes para a decisão.” Esta forma de fundamentação da decisão administrativa de aplicação duma coima, no plano restrito da matéria de facto, continua a permitir que o acoimado tenha um conhecimento perfeito e completo dos factos e das provas que foram considerados para o condenar, uma vez que do auto de notícia devem constar “os factos que constituem a infração, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foi cometida, o nome e a qualidade da autoridade que a presenciou, a identificação dos agentes da infração e, quando possível, de, pelo menos uma testemunha que possa depor sobre os factos”, (artigo 170.º, do CE), elementos que são notificados ao arguido para este apresentar a sua defesa perante a entidade administrativa competente para a aplicação da coima (artigo 175.º, do CE). (…) Assim, se o referido regime primário impõe que a decisão administrativa condenatória indique os factos e as provas que fundamentam a aplicação da coima, já a forma pela qual essa indicação pode ser feita, nomeadamente através de remissão para outra peça processual donde conste essa descrição ( v. g. , auto de notícia), escapa àquela normação primária, pelo que pode ser objeto de ato legislativo do Governo, sem necessidade de autorização da Assembleia da República (vide, neste sentido, o citado Acórdão n.º 62/03).” 12. Se dúvidas subsistissem quanto ao que se acaba de afirmar-se, bastaria rememorar o entendimento firmado pelo Tribunal no Acórdão n.º 345/87, que apreciou uma questão de constitucionalidade com con- tornos idênticos àquela que se suscita nos presentes autos, julgando inconstitucional, por violação do artigo 168.º, n.º 1, alínea d) , da CRP, a norma constante do n.º 5 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 21/85, de 17 de janeiro, na parte em que, como condição do seguimento dos recursos judiciais contra a aplicação de coimas, exigia o depósito prévio da coima a recorrentes que, por falta de meios, o não pudessem efetuar. Naquele aresto pode ler-se o seguinte: “4 – O regime substantivo e adjetivo dos ilícitos de mera ordenação social –instituído pela primeira vez, no nosso país, através do Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de julho – veio a ficar, por força do disposto no artigo único do Decreto-Lei n.º 411-A/79, como que em «ponto morto», isto é, sem possibilidade de aplicação direta e prática.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=