TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

642 sentido e alcance com que vale, por força do n.º 2 do artigo 32.º da Constituição, para as sentenças judiciais de condenação proferidas em processo criminal. Como o Tribunal Constitucional tem sustentado, em jurisprudência constante, o crime e a contraordena- ção não são infrações substancialmente equivalentes, quer na perspetiva dos bens tutelados, quer na perspetiva das reações sancionatórias que a sua prática determina: no primeiro caso, está em causa «a ofensa de bens e valo- res tidos como estruturantes da sociedade», que desencadeia, pela sua gravidade, «um complexo processo com vista a determinar o seu autor e a responsabilizá-lo criminalmente com penas que, sendo de prisão ou multa, assumem sempre um sentido de retribuição ou expiação ética e uma finalidade ressocializadora cuja realização pode implicar, no limite, a privação da liberdade do arguido; nada disso se passa com as contraordenações que, sendo ilícitos, não comprometem os alicerces em que assenta a convivência humana e social, e, dando lugar à aplicação de coimas, não se dirige, através delas, qualquer juízo de censura ético-jurídica à pessoa do agente mas uma simples advertência de alcance comportamental, cuja garantia é apenas e só de ordem patrimonial» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 612/14). Nesta perspetiva dual de análise, não é possível sustentar que as razões que impedem a aplicação das penas criminais antes do trânsito em julgado da condenação, assentes no reconhecimento da intensidade e expres- sividade com que interferem na esfera pessoal do arguido, sejam inteiramente transponíveis para o domínio contraordenacional, garantindo assim a aplicação da coima antes do trânsito em julgado da decisão judicial que julgue a impugnação interposta da decisão que a aplica. Também por isso, a atribuição de efeito devolutivo à impugnação judicial da decisão administrativa de aplicação de coimas, pela prática de infrações ao Direito da Concorrência, atenuada pela possibilidade legal de suspensão da execução da decisão recorrida, verificadas as condições previstas no n.º 5 do artigo 84.º da Lei da Concorrência, não merece qualquer censura constitucional.” 3.11. Por último, também no Acórdão n.º 376/16, não se considerou violado o direito ao recurso, ou no caso, o direito de audiência e defesa consagrados no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição. 3.12. Apesar de o Acórdão n.º 376/16, não se ter expressamente pronunciado sobre essa matéria, decorre cla- ramente da fundamentação dela constante que também não se mostra violado o direito a um processo equitativo (artigo 20.º, n.º 5, da Constituição), nem o princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição). 3.13. Porém, posteriormente, os Acórdãos n. os 674/16 e 675/16, vieram sobre esta matéria proferir juízos de inconstitucionalidade. Contudo, pelas razões constantes do Acórdão n.º 376/16, a que poderemos acrescentar as constantes das decla- rações de voto do Exmo. Senhor Conselheiro João Pedro Caupers e do Exmo. Senhor Conselheiro Teles Pereira, continuamos a entender que a norma do artigo 67.º, n.º 5, do ERS, não é inconstitucional. Efetivamente, como já anteriormente referimos e nos parece de primordial importância, no Acórdão n.º 376/16 é dado especial relevo ao facto de ao recurso poder ser atribuído efeito suspensivo, em certas circunstâncias. Na verdade, como se sublinha no aresto, o arguido pode “requerer a atribuição do efeito suspensivo quando a execução da decisão condenatória lhe causa prejuízo considerável, mediante prestação de caução (artigo 84.º, n.º 5, da Lei da Concorrência) pela forma e montante julgados adequados no caso concreto pelo tribunal ”. (itálico nosso) A existência dessa ampla “válvula de escape” que também está prevista no n.º 5 do artigo 67.º da ERS é fundamental para que seja proferido um juízo negativo de inconstitucionalidade, pois, dessa forma, consegue-se encontrar um equilíbrio constitucionalmente aceitável entre os diversos interesses em conflito. Este aspeto foi também importante para os Exmos. Senhores Conselheiros João Pedro Caupers e Teles Pereira, dizendo o primeiro na declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 675/16: “Na verdade, não creio que tal norma, na medida em que faz depender a atribuição de efeito suspensivo à impugnação judicial das decisões finais condenatórias da ERSE da prestação de caução e da verificação de um prejuízo considerável para o impugnante em resultado da execução da decisão, ofenda o princípio da tutela

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