TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
639 acórdão n.º 394/18 21.ª Tal faculdade é concedida ao visado sempre que a «execução da decisão lhe cause prejuízo considerável». Já aquando da execução de decisões que apliquem medidas de caráter estrutural – nela indo implícita a verificação de prejuízo considerável – o recurso interposto tem efeito suspensivo, nos termos excecionados na segunda parte do n.º 4 do mesmo artigo. 22.ª Inexiste impedimento, mas balizada restrição, ao exercício do direito de impugnação por parte do visado: pretendendo este, com a impugnação, a destruição da imediata executoriedade do ato – vingando entre nós um sis- tema de administração executiva, com o reconhecimento da primazia do interesse público sobre o interesse privado –, fica condicionado à verificação de determinado requisito (causar-lhe a execução da decisão prejuízo considerável) e ao cumprimento de um ónus (prestação de caução). 23.ª A observada conformação do regime da impugnação radica no propósito expresso de «aumentar a equi- dade, a celeridade e a eficiência dos procedimentos de recurso judicial de decisões da Autoridade da Concorrência», com separação clara das regras processuais penais e «harmonizada com o enquadramento legal da concorrência da UE». (conclusão 6.ª). 24.ª Objetiva a incumbência prioritária do Estado de «Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral» e, no âmbito da sua política comercial, de garantir «A concorrência salutar dos agentes mercantis» [Constituição, arts. 81.º, alínea f ) e 99.º, alínea a) ]. 25.ª À Autoridade de Concorrência, entidade administrativa independente (arts. 267.º, n.º 3 da Constituição e 1.º, n.º 1 dos Estatutos anexos ao DL 125/2014, de 18 de agosto), cabe, precisamente, «assegurar a aplicação das regras de promoção e defesa da concorrência nos setores privado, público, cooperativo e social, no respeito pelo princípio da economia de mercado e de livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos merca- dos, a afetação ótima dos recursos e os interesses dos consumidores» (art. 1.º, n.º 3 dos Estatutos). 26.ª Os poderes sancionatórios da Autoridade de Concorrência devem ser exercidos «sempre que as razões de interesse público na perseguição e punição de violações de normas de defesa da concorrência determinem a aber- tura de processo de contraordenação no caso concreto, tendo em conta, em particular, as prioridades da política de concorrência e os elementos de facto e de direito que lhe sejam apresentados, bem como a gravidade da eventual infração, a probabilidade de poder provar a sua existência e a extensão das diligências de investigação necessárias para desempenhar, nas melhores condições, a missão de vigilância do respeito pelos artigos 9.º, 11.º e 12.º da presente lei e pelos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia» (art. 7.º, n.º 2 da Lei 19/2012, de 8 de maio; cf., igualmente, art. 6.º, n.º 2 dos Estatutos). 27.ª Presente a margem de liberdade de conformação por parte do legislador ordinário em matéria de impug- nação de atos administrativos, o descrito balanceamento em causa entre os valores da tutela da posição jurídica do visado e o valor da realização de determinada incumbência prioritária do Estado, constitucionalmente exigida e prosseguida por entidade administrativa independente, não sendo impediente, não se mostra desrazoavelmente obstaculizador ao mais amplo exercício do direito de impugnação. 28.ª Deverá, igualmente quanto ao regime estabelecido nos n. os 4 e 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, considerar-se que, «enquanto medida necessária e adequada a garantir a tutela de bens jurídicos com dignidade constitucional (…), bem como a celeridade e eficiência da reação sancionatória no caso de lesão desses bens jurídicos tutelados, não poderá ser entendido como uma restrição desproporcional ao direito de impugnação judicial da decisão admi- nistrativa sancionatória, à luz dos critérios previstos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição» (Ac. TC 373/15). 29.ª Não constitui objeto do presente recurso confrontar abstratamente, em termos de constitucionalidade, com referência a diversas situações hipotéticas, as normas contidas nos n. os 4 e 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, não as limitando, na sua aplicação, ao caso concreto discutido no processo [Constituição, art. 280.º, n. os 1, alínea a) e 6; LOFPTC, arts. 70.º, n.º 1, alínea a) , 71.º, n.º 1 e 79.º-C]. 30.ª A norma constante do n.º 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, na sua aplicação limitada ao caso dos autos, não abrange a questão da (in)exigibilidade de prestação de caução, em vista da insuficiência de meios do visado.
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