TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

595 acórdão n.º 378/18 a um regime fiscal mais gravoso que os restantes”, como sugere José Maria Fernandes Pires (cfr. Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, 3.ª edição, Almedina Editora, Coimbra, 2015, p. 504), a mesma deveria englobar, ou pelo menos considerar, o conjunto do património imobiliário de cada contribuinte, sob pena de atingir os dife- rentes contribuintes de forma excessivamente desigual. Tanto mais que o imposto em questão não é progressivo, e que basta por isso que o valor patrimonial tributário de um prédio seja inferior em apenas um euro ao milhão exigido pela referida verba para que o respetivo proprietário nada tenha a pagar, mesmo que seja proprietário de vários prédios desse valor. Há, de facto, um pecado original na verba 28.1 da TGIS, tal como ela foi concebida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e que, como veremos adiante, a Lei n.º 83-C/2013 agravou com o aditamento dos terrenos para construção à mencionada previsão normativa. É que, ao não alargar a base de tributação, pelo menos, ao conjunto do património imobiliário de cada contribuinte, não personalizando suficientemente o imposto, aquela verba não se revelou adequada a prosseguir “o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efetiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento”, como o legislador se propôs na exposi- ção de motivos da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª, que esteve na origem da referida Lei n.º 55-A/2012. 9. Como dissemos anteriormente, a alteração de redação feita pela Lei n.º 83-C/2013, que aditou à verba 28.1 da TGIS os terrenos para construção, introduziu um fator de distorção no regime de tributação do patrimó- nio imobiliário que representa, não apenas uma distorção na coerência interna do conjunto do sistema fiscal, ou mesmo do Imposto do Selo considerado isoladamente, mas uma distorção na própria coerência interna da norma tributária contida na referida verba. De facto, ao reunir na mesma verba a tributação de casas de luxo e de terrenos para construção, no pressuposto de que ambos se subsumem genericamente à categoria de bens imóveis de elevado valor patrimonial tributário, a norma cuja validade se discute confundiu manifestações de riqueza com fatores de produção dessa mesma riqueza. Tem sido salientado pela doutrina fiscal que, enquanto critério de igualdade tributária, o princípio da capaci- dade contributiva “exige, antes de mais, a personalização do imposto, que quando se tribute uma qualquer mani- festação de riqueza se pergunte pela pessoa que está por trás dela e pelas condições em que se encontra” (cfr. Sérgio Vasques, “Capacidade contributiva, rendimento e património”, in F iscalidade – Revista de Direito e Gestão Fiscal , n.º 23, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 19). Ora, se por trás do tributo imposto ao proprietário de uma casa de habitação de valor patrimonial superior a um milhão de euros poderá estar um contribuinte com força económica suficiente para suportar a respetiva carga fiscal, por trás do tributo imposto ao proprietário de um terreno para construção estará normalmente um empreendedor, em regra sob a forma de uma sociedade comercial dedicada à promoção imobiliária, sobre cuja força económica nada sabemos. Na verdade, não podemos presumir que aquele contribuinte tem uma força eco- nómica proporcional ao valor do terreno, que é meramente instrumental em relação à sua atividade económica. Desconhecemos qual a margem de lucro que retirará do seu exercício, se é que está em condições jurídicas e eco- nómicas de a desenvolver, ou se não terá mesmo uma situação líquida negativa. O que nos leva a uma segunda perversão do princípio da capacidade contributiva, que exige que se tribute o rendimento líquido do contribuinte, depois de deduzidas as despesas necessárias à sua própria obtenção. Dir-se-á que essa exigência só se aplica à tributação de rendimento, e não à tributação de património, mas esse argumento apenas evidencia a diferente realidade da tributação de terrenos para construção, que se repercute mais sobre a atividade económica desenvolvida pelo seu proprietário do que sobre o valor do bem em si mesmo. Com a agravante de que a respetiva carga fiscal, se não inviabilizar em definitivo aquela atividade, acabará por ser suportada pelo consumidor final dos produtos imobiliários que dela resultar, de cuja capacidade contributiva nada podemos presumir sem conhecer a respetiva tipologia edificatória e valor.» 9. Entende-se não ser de acolher um tal entendimento. Estando em causa a aferição do cumprimento, pelo legislador, do princípio constitucional da igual- dade – que não sofre modificação de sentido quando aplicado ao domínio tributário – não é aceitável que a

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