TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

581 acórdão n.º 366/18 Assim o Acórdão n.º 483/02: «(…) Não significa isto pretender-se sustentar que têm os arguidos um verdadeiro «direito subjectivo à prescrição». Significa, isso sim, fazer realçar: – que o instituto da prescrição se encontra sedimentado no ordenamento jurídico português há variadíssimas décadas, não podendo, por conseguinte, o legislador constituinte de 1976 ter sido alheio à respectiva pre- visão tal como, em linhas gerais, se desenhava naquele ordenamento, ou seja, não podendo o legislador do Diploma Básico ser indiferente à política criminal e à dogmática que lhe estava subjacente, no que toca à repercussão que o decurso do tempo tinha quanto à não efectivação do poder punitivo do Estado; – que existem razões, constitucionalmente fundadas, decorrentes da ideia de certeza e de paz jurídica, do estado de direito democrático e do progressivo esbatimento da necessidade de perseguição penal com o decurso do tempo, à luz dos fins que tal perseguição serve, bem como das próprias garantias de defesa dos arguidos, que levam à consagração de um instituto como aquele; – que estes valores têm assento constitucional e reclamam, por si, que o citado instituto tenha de ser visto com um próprio valor constitucional para o comum dos ilícitos, designadamente tratando-se de crimes como aquele cujo cometimento é assacado aos ora recorrentes; – que é razoável que a sociedade, objectivamente considerada, possa entender – ao menos enquanto se man- tiverem em vigor na sua essencialidade os preceitos que instituem a prescrição e rejam os respectivos prazos, modos de ocorrência e contagem – que, uma vez decorrido o tempo previsto nesses preceitos, não recla- mam perseguição criminal os agentes de factos delituosos cuja prática de há muito ocorreu, o que inculca que também é razoável que aquela sociedade conte com que aquela perseguição não opere mediante nor- mas ou processos interpretativos de onde resulte, na realidade prática, a ineficácia da actuação do instituto da prescrição. Ora, um valor constitucional assim delineado deve, inequivocamente, ser atendido, e daí dever-se-ão retirar as necessárias consequências quanto à interpretação do conjunto normativo agora em análise.» Da jurisprudência constitucional portuguesa resulta, outrossim, que ao instituto da prescrição dos pro- cedimentos punitivos (e, bem assim, das penas) – não obstante a falta de previsão constitucional expressa – pode reconhecer-se um valor constitucionalmente atendível. Nesses termos, cumpre aferir do respeito pelos valores constitucionais que informam a prescrição do procedimento criminal. 12. Sobre os valores constitucionalmente atendíveis que informam o instituto da prescrição do procedi- mento criminal (e das penas) já se pronunciou, em diversas ocasiões, o Tribunal Constitucional. Assim, no já citado Acórdão n.º 483/02: «(…) 6.1. Haverá que ter em mira, e tão só, a questão da prescritibilidade do procedimento criminal em geral relati- vamente a crimes que, tal como o dos autos, o ordenamento jurídico sujeita ao instituto da prescrição. Neste contexto, não se poderá escamotear que na nossa Lei Fundamental não se perspectiva unicamente como relevante, no que à instituição da criminalização diz respeito, o valor de uma perseguição penal repousada na pree- minência da danosidade da acção criminosa. Como é sabido, se esse valor ético-jurídico fundamental deve pautar aquela instituição, também se não deverá olvidar que são igualmente atendíveis princípios ou valores, também de ressonância ético-jurídica fundamental, tais como os da necessidade da pena, de segurança, de certeza, de paz jurídica e até de garantias de defesa dos indiciados agentes do crime. (…)

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