TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

544 executada detidas pela garante, o mesmo é dizer, nos casos em que a garante detém, direta ou indiretamente, a totalidade do capital social da executada, o valor desta. As duas grandezas – o valor da garante e o valor da executada – são da mesma natureza e, por isso mesmo, perfeitamente comparáveis. 12.3. Em terceiro lugar, diz-se que a razão de ser da dedução prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.º-A do CPPT – evitar que o património da executada, que constitui a garantia geral da dívida exe- quenda, seja contabilizado na aferição do valor da garantia especial constituída pela fiança −, não se aplica aos casos, como o dos presentes autos, em que o fiador renuncia ao benefício da excussão prévia. Tal renúncia implica que o património do fiador responde pela dívida ainda que o credor não tenha excutido o patrimó- nio do devedor principal, pelo que deixa de fazer sentido subtrair este ao património daquele. Sucede que a renúncia ao benefício da excussão prévia em nada altera a composição da garantia patrimo- nial da dívida exequenda, no caso de a fiança vir a ser reputada idónea. A garantia compreende o património do devedor principal – a entidade executada – e o património do fiador – a entidade garante; é este acréscimo de garantia patrimonial, o património do fiador, que vem reforçar a garantia geral do crédito constituída pelo património do devedor. Ora, se o património do devedor integra, pelo menos em parte, o património do fiador, pelo facto de este, como SGPS, deter direta ou indiretamente partes de capital daquele, a dedu- ção prevista na lei é a que decorre da própria natureza da fiança. Se as partes de capital da executada fossem consideradas na determinação do valor do património da garante, o património daquela seria contabilizado duas vezes – como património do devedor principal (a garantia geral do crédito) e como parte integrante do património do fiador (a garantia especial do crédito). Também aqui não há, pois, razão para supor que o legislador incorreu em «erro manifesto». 12.4. Finalmente, argumenta a decisão recorrida que a desproporcionalidade da solução legal se mani- festa no resultado gerado na situação dos autos, em que a fiança prestada por uma sociedade com um ativo de € 212 147 138 e capitais próprios de € 17 298 437 é reputada inidónea para garantir um montante de €  93 870,61. Acresce o argumento, aduzido pela recorrida nas suas contra-alegações, de que, sendo o valor das partes de capital da executada, no montante de €  9 525 790, superior ao valor total das ações da fiadora, no montante de €  8 649 236,50, é evidente a desproporcionalidade da dedução. Os números invocados na decisão recorrida e nas contra-alegações apenas causam perplexidade se abs- trairmos das razões técnicas e materiais que informam o regime legal. Em primeiro lugar, não faz sentido comparar o valor do ativo da sociedade garante com o montante a garantir; o património líquido resulta da diferença entre o ativo e o passivo, e pode bem suceder que uma sociedade com um grande ativo tenha capitais próprios negativos, se o valor do seu passivo for ainda mais elevado. Em segundo lugar, a compara- ção entre os capitais próprios e o montante a garantir omite um dos critérios de avaliação do património da sociedade acolhido na lei, o «valor empresarial» ou «valor de capitalização», cujo fundamento, como vimos, se afigura razoável; no caso dos presentes autos, a SGPS apresenta resultados negativos nos dois últimos exercícios, o que determina, segundo a lei, que a sua rentabilidade é tida como nula, com evidentes reflexos negativos na sua avaliação global. Em terceiro lugar, nada há de absurdo no facto de as partes de capital da executada terem um valor superior ao valor da sociedade garante, apesar de esta deter indiretamente a totalidade dos títulos representativos do capital social daquela; basta, para o efeito, que os capitais próprios e o valor empresarial da executada sejam superiores ao da sociedade garante, o que é naturalmente possível. No caso vertente, a executada representa uma parcela significativa do ativo da garante, de tal modo que, subtraído o valor daquela ao valor desta, o resultado obtido é negativo – isto é, a fiança prestada não reforça, efetivamente, a garantia geral da dívida exequenda, constituída pelo património do devedor principal. De tudo isto decorre que os resultados alcançados pela AT, através da aplicação dos critérios legais de aferição da idoneidade da fiança, nada revelam que faça prova de «erro manifesto» do legislador ou que evi- denciem a desproporcionalidade das opções que consagrou. Resta, assim, concluir que a norma que constitui o objeto do presente recurso não é inconstitucional.

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