TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
54 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL XII – Embora um dos argumentos invocados no Acórdão n.º 216/10 seja o de que, apesar do disposto no artigo 7.º, n.º 3, da LADT, as pessoas coletivas com fins lucrativos que verdadeiramente carecem de apoio judiciário já beneficiam de isenção de custas judiciais, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, alínea u) , do Regulamento das Custas Processuais (RCP), aquela isenção de custas só vale enquanto se mantiverem pendentes os processos em causa, deixando de existir quando haja desistência do pedido de insolvência ou quando este seja liminarmente indeferido ou julgado improcedente, por sentença; por outro lado, proferida a sentença que declara a insolvência, tal determinará a constituição de uma massa insolvente, à qual já não é aplicável a referida isenção subjetiva. XIII – A isenção de custas prevista no artigo 4.º, n.º 1, alínea u) , do RCP relativamente às sociedades civis ou comerciais em situação de insolvência ou em processo especial de revitalização, devido aos pressupostos de cada uma dessas situações e, bem assim, às limitações à liberdade de empresa a elas associadas, não salvaguarda a proteção jurídica constitucionalmente devida àquele tipo de entidades, em ordem a assegurar-lhes que o acesso à justiça não lhes seja denegado por insufi- ciência de meios económicos; a isenção de custas em análise, apesar de coincidir com uma das modalidades que pode revestir o apoio judiciário, não está funcionalizada ao direito fundamental à proteção jurídica para efeitos de garantia do acesso aos tribunais previsto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, pois o exercício deste último por parte de sociedades civis ou comerciais pode justificar-se independentemente de as mesmas se encontrarem em qualquer situação de dificulda- de económico-financeira, e tal exercício não pode ficar dependente de limitações da autonomia do titular do direito e, muito menos, ser colocado na dependência do acordo de outros particulares, nomeadamente dos credores. XIV – Apesar de todas as diferenças existentes entre o artigo 20.º, n.º 1, in fine , da Constituição e o artigo 6.º, § 1, primeira frase, da CEDH, a verdade é que a jurisprudência do TEDH tem vindo a reco- nhecer um direito à proteção jurídica ancorado naquele preceito, direito esse cuja titularidade não é negada às sociedades comerciais, bem pelo contrário; na interpretação do TEDH, o direito a um processo equitativo consignado no artigo 6.º da CEDH pode exigir, em determinadas situações, a concessão de apoio judiciário não só a pessoas singulares, mas, ainda que em circunstâncias mais exigentes, também a pessoas coletivas, incluindo aquelas que prosseguem fins lucrativos; a recusa de apoio judiciário não pode ser feita de plano, em abstrato, mas exige em todos os casos e relativamente a todo o tipo de sujeitos processuais uma apreciação sobre se o direito de acesso a um tribunal do interessado está, ou não, em causa; este entendimento não é compatível com uma concretização legislativa do direito fundamental à proteção jurídica para efeitos de garantia do acesso aos tribunais que pura e simplesmente recuse tal proteção a toda uma categoria de sujeitos apenas com base na sua natureza jurídica, inviabilizando qualquer apreciação das circunstâncias em que o sujeito carenciado se encontra e do processo concretamente em causa, como sucede com a norma sob apreciação. XV – A propósito do argumento segundo o qual a proteção jurídica de entidades com fins lucrativos – sociedades ou estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada – seria contrária à injun- ção constitucional prevista no artigo 81.º, alínea f ) , da Constituição de assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, e a sua competitividade, considerando o apoio judiciário a pessoas coletivas com fins lucrativos como dis- funcional e potencialmente criador de desigualdades entre as empresas concorrentes num mesmo mercado e, por essa via, como potencial fator de desequilíbrio desse mercado, o Acórdão n.º 591/16
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