TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
528 das partes de capital da sociedade executada que sejam detidas pela fiadora. Desde logo, porque não se alcança a lógica que preside à subtração de realidades diversas: poderíamos eventualmente compreender essa subtração se o valor considerado fosse o da totalidade das participações sociais detidas pela fiadora; mas, como deixámos já dito, o valor a considerar nos termos do método legal não é esse, mas o valor das ações da própria fiadora. Ou seja, se o método de avaliação da garantia legalmente consagrado pretende desconsiderar o valor das participações na execu- tada, deveria tomar como ponto de partida o valor dos ativos não correntes e nunca ao valor das ações da sociedade garante, já que as duas variáveis não têm qualquer correlação entre si. Por outro lado, não se compreende o porquê de deduzir o valor da participação social que a fiadora detém na sociedade executada; nem se diga (como o fazia a AT antes do critério estar legalmente consagrado) que essa dedução é imprescindível, sob pena de se «considerar duas vezes o mesmo património». Esta tese assenta num pressuposto errado, qual seja o de que a fiança só poderia ser acionada após a excussão do património da executada, nos termos gerais previstos no artigo 638.º do Código Civil (CC) (…); se assim fosse, ou seja, se o acionamento da garantia tivesse como requisito necessário o esgotamento e insuficiência do património da executada, sim, faria sentido subtrair o valor da participação da fiadora na sociedade executada; mas não é assim, nos casos – como o sub judice – em que a fiança foi prestado com renúncia ao benefício da excussão prévia, como o permite o artigo 640.º, alínea a) , do CC (…); ou seja, a fiadora obrigou-se com todo o seu património no cumprimento da dívida exequenda como principal pagadora, pelo que não faz sentido excluir na avaliação desse património a sua participação na sociedade devedora. Eram estas as críticas que fazíamos ao critério de avaliação quando a AT, ainda sem lei que o prescrevesse, o adotou e que mantemos apesar da sua consagração na letra da lei. 2.2.2.2. O facto de o critério resultar agora expressamente da lei não o torna imune a um juízo de proporcio- nalidade. Na verdade, também o legislador, pese embora a sua liberdade conformadora, está sujeito a princípios e regras jurídicas que, num estado de Direito, sustentam as relações entre o estado e os cidadãos. Está, pois, o legislador, como qualquer poder público, obrigado a respeitar a ideia de estado de direito inscrita no princípio do estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da CRP (…). O princípio da proibição do excesso aplica-se a todos e quaisquer atos dos poderes públicos, vinculando o legislador, a administração e a jurisdição, sendo certo que a margem de atuação do legislador é de controlo mais restrito: os tribunais limitam-se, então, a examinar se a regulação legislativa é manifestamente inadequada. Isto porque se reconhece ao poder legislativo uma “prerrogativa de avaliação” da relação meio/fim da medida, pelo que apenas caberá ao tribunal ajuizar da ocorrência ou não ocorrência de um “erro manifesto” nessa mesma avaliação. Para avançarmos na averiguação da eventual violação pelo art. 199.º-A do CPPT do princípio da proporcio- nalidade, vamos socorrer-nos da jurisprudência do Tribunal Constitucional, que é o órgão judicial especialmente vocacionado para conhecer as questões de constitucionalidade. A proporcionalidade é questão abundantemente tratada pela jurisprudência do Tribunal Constitucional. Como ficou dito no acórdão n.º 632/08 desse Tribunal (…), «a ideia de proporção ou proibição do excesso – que, em Estado de direito, vincula as ações de todos os poderes públicos – refere-se fundamentalmente à necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações estaduais não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos (e, portanto, não equilibrados) para as pessoas a quem se destinem. Dizer isto é, no entanto, dizer pouco. Como se escreveu no Acórdão n.º 187/01 (ainda em desenvol- vimento do Acórdão n.º 634/93). O princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas res- tritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos). A esta definição geral dos três subprincípios (em que se desdobra analiticamente o princípio da proporcionali- dade) devem por agora ser acrescentadas, apenas, três precisões. A primeira diz respeito ao conteúdo exato a confe- rir ao terceiro teste enunciado, comummente designado pela jurisprudência e pela doutrina por proporcionalidade
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