TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

496 do artigo 51.º dos Estatutos da ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março); da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, onde não se afasta a regra geral de atribuição de efeito suspen- sivo à impugnação judicial (suprimindo porém a proibição de reformatio in pejus , no n.º 8 do artigo 416.º do Código dos Valores Mobiliários); da ERSAR – Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (cfr. artigo 52.º dos Estatutos da ERSAR, aprovados pela Lei n.º 10/2014, de 6 de março); da ANAC – Autoridade Nacional da Aviação Civil (cfr. artigo 41.º dos Estatutos da ANAC, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 40/2015, de 16 de março); da ASF – Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (artigo 209.º da lei n.º 147/2015, de 9 de setembro). Assim, uma análise do regime sancionatório das várias autoridades reguladoras independentes, permite retirar duas conclusões. Em primeiro lugar, a existência de poderes sancionatórios constitui um dos aspetos que caracteriza o modelo próprio de justiça da regulação (Pedro Gonçalves, Catarina Gouveia Alves e Ana Cláudia Guedes, O contencioso da Regulação em Portugal – Relatório de Pesquisa e Análise da Jurisprudência sobre Regulação Pública, CEDIPRE – Centro de Estudos de Direito Público e Regulação, Coimbra, 2010, p. 8), pois é uma nota comum que destoa na profunda disparidade e heterogeneidade no modelo de atuação das várias entidades. Em segundo lugar, é visível a consagração de desvios às regras processuais contraordenacionais, enformada pela convicção de que o regime geral das contraordenações e coimas é desadequado à atuação das entidades reguladoras, impondo-se uma modificação ou adaptação do seu regime ao circunstancialismo que envolve a atuação daquelas (cfr. Paulo Sousa Mendes, “O procedimento sancionatório especial por infrações às regras de concorrência”, in Regulação em Portugal: novos tempos, novo modelo?, Almedina, Coimbra, 2009, p. 707). É neste contexto que se coloca a opção legislativa consubstanciada na consagração de um efeito mera- mente devolutivo às impugnações judiciais de decisões sancionatórias: para estas entidades, avulta uma preo- cupação de potenciação da eficácia das normas cuja violação constitui contraordenação, o que é reforçado pelo afastamento da proibição de reformatio in pejus de acordo com o n.º 3 do artigo 67.º dos Estatutos da ERS. Recupera-se, aqui, o que já se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/16: «Antecipa-se, sem dificuldade, que o legislador, na modelação do regime de impugnação das decisões sancio- natórias proferidas por tais entidades administrativas, tenha ponderado a necessidade de conferir maior eficácia aos respetivos poderes sancionatórios, de modo a garantir, no plano substantivo, uma maior proteção aos valores e bens tutelados nos específicos domínios normativos em que atuam. Atribuindo, em regra, efeito devolutivo ao recurso, e condicionando o efeito suspensivo à prestação de caução e à existência de «prejuízo considerável», procura-se minimizar os recursos judiciais infundados cujo objetivo seja protelar no tempo o pagamento da coima. Se conjugarmos a opção legal de atribuir à impugnação efeito meramente devolutivo, com o afastamento da regra da proibição da reformatio in pejus vigente no regime geral das contraordenações, que é solução também consagrada na Lei da Concorrência (artigo 88.º, n.º 1), maior evidência assume o propósito desincentivador subjacente à nova regulamentação legal sobre a matéria». Deste modo, a tendência de criação de entidades reguladoras, enquanto instrumento capaz de simul- taneamente velar pelo funcionamento do mercado e garantir a qualidade dos serviços prestados em dado setor, demanda a atribuição de mecanismos eficazes na aplicação de sanções (cfr. Fernanda Maçãs, “O con- trolo jurisdicional das autoridades reguladoras independentes”, in Cadernos de Justiça Administrativa , n.º 58, 2006, p. 22), e tem conduzido à emissão de normas processuais especiais, como a fixação de prazos curtos de impugnação e o afastamento do princípio da proibição da reformatio in pejus , apartando-se o legislador contraordenacional, em maior ou menor medida, consoante os âmbitos contraordenacionais, das soluções normativas do processo penal (cfr. Frederico Costa Pinto, “O ilícito de mera ordenação social e a erosão da subsidiariedade da intervenção penal”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, vol. 7, n.º 1, 1997, p. 79).

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