TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

494 E, com referência ao sentido normativo aqui sindicado, contido no artigo 67.º, n.º 5, dos Estatutos da ERS, são inteiramente transponíveis para os presentes autos as considerações de enquadramento constantes do Acórdão n.º 728/17, que se retomam: «6. Conforme consta do preâmbulo do diploma citado, a aprovação dos Estatutos da Entidade Reguladora da Saúde emerge da concatenação de dois diplomas distintos, por um lado, do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio (entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto), que procedeu à reestruturação da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), definindo as suas atribuições, organização e funcionamento e, por outro lado, da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, que aprovou a lei-quadro das entidades reguladoras, impondo a neces- sidade, em conformidade com o disposto no artigo 3.º, alínea i) , de aprovar e publicar os respetivos estatutos. Em consequência, o Governo, ao abrigo do disposto no artigo 198.º, n.º 1, alínea a) , da CRP (que prevê a competência legislativa do Governo em matéria não reservada da Assembleia da República), aprovou os referidos Estatutos da Entidade Reguladora da Saúde. Estabelece o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 126/14 que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) é uma pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, de autonomia de gestão, de indepen- dência orgânica, funcional e técnica, e de património próprio, gozando de poderes de regulação, de supervisão e de fiscalização, bem como de poderes sancionatórios. A ERS é, assim, uma entidade administrativa independente, nos termos do artigo 267.º, n.º 3, da CRP, e atua no quadro das incumbências prioritárias do Estado de garantir o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de saúde (artigo 64.º, n.º 3 da CRP), visando tutelar, no setor, os direitos dos utentes, bem como a transparência e a concorrência do mercado [artigos 81.º, alíneas f ) e i) e 99.º, alíneas a)  e e), da CRP].  A criação da ERS surgiu no contexto da liberalização do mercado da saúde, como reflexo da necessidade de enquadramento da participação e atuação das empresas público-privadas, e de regulação, supervisão e fiscalização das entidades do setor privado, social e cooperativo, dado estar em causa uma área vital para a sociedade e para os direitos dos utentes. A regulação tem uma lógica específica, que deve ser separada tanto quanto possível da lógica política, tornando- -se necessário estabelecer adequada distância entre a política e o mercado, de modo a conferir-lhe estabilidade, pre- visibilidade, imparcialidade e objetividade. Por outro lado, a abertura à concorrência de setores de atividade, que antes se encontravam sujeitos à influência estatal, trouxe consigo a necessidade de separar a regulação do funcio- namento do mercado e a intervenção das entidades públicas enquanto sujeitos económicos (Acórdão n.º 376/16). Para a realização da sua missão, foram-lhe acometidas as seguintes atribuições pelo artigo 5.º do referido Esta- tuto: a regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde; a supervisão da atividade e funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde no que respeita ao cumprimento dos requi- sitos de exercício da atividade e de funcionamento, incluindo o licenciamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde; a garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de saúde de qualidade, e dos demais direitos dos utentes; a legalidade e transparência das relações económicas entre os diversos operadores, entidades financiadoras e utentes. O Governo consignou, no capítulo VI do Diploma aqui em causa, um regime atinente a infrações e sanções, que se inicia no artigo 61.º (com a definição das contraordenações) e culmina no artigo 67.º, que consagra o regime da impugnação judicial das contraordenações aplicadas, conferindo ao Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão plena jurisdição das decisões em que tenha sido fixada pela ERS uma coima ou uma sanção acessória, podendo reduzir ou aumentar a coima ou alterar a sanção acessória (n.º 3) e atribuindo ao recurso efeito mera- mente devolutivo, nos termos do n.º 5 do citado preceito. Nestes preceitos, mostra-se inscrito um regime particular contraordenacional em matéria de saúde, o qual, além da definição das contraordenações, prevê ainda sanções acessórias, o modo de determinação do  quantum das coimas, o regime de prescrição das mesmas, a publicidade das sanções e, finalmente, o controlo pelo Tribunal competente do modo de aplicação de tais contraordenações.

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