TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
486 de ADN a condenados em pena igual ou superior a 3 anos de prisão, ainda que substituída, apresenta-se como uma medida útil, necessária e proporcional aos fins prosseguidos, sendo os casos de eventual desnecessidade ou excesso deixados ao prudente critério jurisdicional a fundamentar com base nos elementos concretos do processo, em concretização da tutela dos direitos fundamentais dos visados, o que se insere plenamente nos fins da reserva judicial de reforço da tutela conferida pela posição institucional de neutralidade e de indepen- dência que caracterizam estatuto do juiz. O regime legal em que se insere a norma em apreciação responde à prescrição dos pressupostos materiais, formais, orgânicos e procedimentais que densificam suficientemente a autorização legal para a medida e acautela o justo equilíbrio entre interesses públicos e privados concorrentes. A opção legislativa concretizada na norma em análise pode não corresponder à melhor solução de regulação dos bens que põe em confronto, mas isso não demonstra a sua inadequação, desnecessidade ou excesso diante do que acima a se deixou exposto. A consideração de qual seja a melhor opção será sempre um problema que deve ocupar apenas o legislador ordinário, motivando-o, sendo caso disso, ao aperfeiçoamento da lei a qual – de resto – entretanto já foi alterada pela Lei n.º 90/2017, de 22 de agosto. Certo é o regime assim instituído sempre oferece maior densidade da habilitação legislativa específica exigida pela Constitui- ção do que o que resultaria da mera “densificação” judicial da norma de habilitação a produzir em cada caso concreto, sendo, por isso, preferível. 27. A associação entre a condenação e a recolha da amostra, estabelecida de forma abstrata, i.e., sem consideração das concretas circunstâncias que ditaram a condenação, como por exemplo o grau de culpa do agente, ou mesmo a natureza do crime verificado, pode também induzir a interrogação sobre a conformidade da norma com a proibição contida no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, segundo a qual «nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos». Esta proibição elevou à categoria de princípio jurídico-constitucional a não automaticidade dos efeitos das penas, o que expressa a rejeição dos seus efeitos infamantes ou estigmatizantes (cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 311/12). Como se salientou recentemente no Acórdão n.º 132/18, por referência tam- bém a jurisprudência anterior do Tribunal, designadamente o Acórdão n.º 284/89, «com tal preceito cons- titucional pretendeu-se proibir que, em resultado de quaisquer condenações penais, se produzissem auto- maticamente, pura e simplesmente ope legis , efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos e pretendeu-se que assim fosse porque, em qualquer caso, essa produção de efeitos, meramente mecanicista, não atenderia afinal aos princípios da culpa, da necessidade e da jurisdicionalidade, princípios esses de todo inafastáveis de uma Lei Fundamental como a Constituição da República Portuguesa que tem por referente imediato a dignidade da pessoa humana». Ora, a este respeito convém começar por salientar que a determinação da recolha de ADN ao condenado não surge imediatamente por “força da lei”. Com efeito, não deve ser ignorado que esta medida restritiva de direitos exige a intermediação do juiz, devendo ser por este ordenada ou afastada, nos termos do artigo 8.º, n.º 6, quando esta «se mostre desnecessária ou inviável». A recolha de amostras não decorre, pois, de forma imediata do trânsito em julgado da condenação em pena determinada. Ademais, dependendo embora da verificação de pressuposto da condenação (transitada em julgado) pela prática de crime, a medida em causa não tem carácter punitivo, como acima já se deixou assinalado, o fim da recolha de ADN é a investigação criminal e não, propriamente, punir o arguido como uma sanção adicional pelo crime por que já vai condenado. O legislador vê na condenação em pena igual ou superior a 3 anos um critério que permite identificar os visados pela ordem de recolha de ADN como pessoas que já demonstraram capacidade para cometer uma infração de uma certa gravidade, o que não traduz, nem equivale necessaria- mente, à imposição de uma pena adicional pela infração por qual vai condenado (neste sentido, afastando a conclusão de que uma medida semelhante pudesse ser considerada uma pena no sentido do artigo 7.º da Convenção, vide acordão do TEDH Van der Velden v. Países Baixos ). Como o Tribunal Constitucional tem referido, «o artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, (…) “[…] não proíbe a consagração de penas que se traduzam na perda de direitos civis, mas sim que da simples condenação
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