TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

479 acórdão n.º 333/18 uma amostra biológica ordenada judicialmente resultou na sua condenação criminal. OTribunal considerou que, embora a interferência tenha sido prescrita pela lei francesa e tenha perseguido um objetivo legítimo, de acordo com o preceito em causa do CPP francês, a duração do armazenamento de ADN não poderia exceder quarenta anos no caso de pessoas condenadas por delitos que o Governo considerou apresentar «um grau específico de gravidade». Apesar de o prazo de quarenta anos, em princípio, representar um período máximo a ser ajustado, por falta de regulação posterior ele é, na prática, tratado como regra geral e não como um limiar máximo. Efetivamente, o TEDH também referiu que em 16 de setembro de 2010 o Conselho Constitucional francês determinou a não inconstitucionalidade desta solução desde que, inter alia, fosse determinado «o período de armazenamento de tais dados pessoais» tendo em conta a finalidade do arquivo e a natureza e gravidade dos crimes cometidos. Apesar disso, nenhuma diferenciação foi introduzida, o que determinava a aplicação do prazo de retenção de quarenta anos a todos os casos, independentemente da disparidade de situações – no caso analisado, o requerente era um dirigente sindical que tinha atingido um polícia com um guarda-chuva. OTribunal também considerou que o regime aplicável ao armazenamento de perfis de ADN não conferia aos titulares dos dados uma proteção suficiente, devido à sua duração e ao facto de os dados não poderem ser apagados. Não se tratava, por isso, de um justo equilíbrio entre os interesses públicos e privados concorrentes. 15. Assim, o TEDH tem vindo a ponderar, caso a caso, se a legislação nacional do Estado em causa oferece garantias adequadas contra a extração e a retenção indiscriminada e genérica de amostras e perfis de ADN – nomeadamente por se tratar de pessoas condenadas por infrações que atingiram um certo grau de gravidade – e se assegura a proteção efetiva dos dados pessoais retidos contra uso indevido e abuso. Afere, assim, se foi alcançado um justo equilíbrio entre os interesses públicos e privados concorrentes, encontrando- -se a regulação nacional dentro da margem de apreciação do Estado-parte demandado. c) Do mérito 16. A proteção dos dados pessoais e da identidade genética do ser humano assume uma centralidade no mundo atual a que a ordem jus-constitucional da República Portuguesa não fica indiferente. A questão objeto do presente recurso prende-se com uma dimensão estrita dessa problemática: a determinação judicial da recolha de uma amostra do perfil genético do arguido na sequência de condenação por crime em pena igual ou superior a três anos de prisão, ainda que substituída, que se destina a integrar o banco de dados de ADN, o que serve fins de investigação criminal. A extração de elementos do corpo do indivíduo como sejam a saliva, ou o sangue, evidencia potencial de danosidade dos direitos fundamentais do visado, constitucionalmente consagrados. Eis-nos, pois, diante de um confronto entre o dever do Estado na realização da justiça e os direitos fundamentais do visado. Torna-se, pois, imprescindível começar por identificar os direitos fundamentais constitucionalmente tutelados que são postos em causa. Neste contexto, o recorrente sustenta a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 8.º, n.º 2, da LBDADN, na «violação grave do direito à integridade física e reserva do património genético do arguido, pondo claramente em crise a dignidade humana do arguido» e na «violação do artigo 26.º, n. os 1 e 2, da Constituição» (cfr. n.º 24 e 27 do recurso de constitucionalidade, fls. 39 do apenso). 17. As normas julgadas inconstitucionais pelos Acórdãos n. os 155/07 e 228/07 do Tribunal Constitu- cional acima referidos são distintas da sob escrutínio no presente processo pelo que não é possível a simples remissão para essas decisões neste contexto. No tocante ao enquadramento das questões do consentimento e da coercibilidade em sede de análises de ADN, a situação ao tempo da prolação daqueles acórdãos caracterizava-se por uma indefinição no plano

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