TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
433 acórdão n.º 331/18 Código Civil, no sentido de que, por não ter sido reduzido a escrito o contrato de arrendamento, o arrendatário de prédio expropriado por utilidade pública não tem direito a indemnização. 2. A referida interpretação é inconstitucional por violação dos direitos fundamentais da propriedade privada e a uma justa indemnização, bem como dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da igualdade (arts. 62.º, 13.º e 266.º da Constituição). 3. A inconstitucionalidade desta interpretação normativa foi suscitada na Conclusão 13.ª das Alegações da recorrente de 26.10.2015. 4. Como se poderá ler na pág. 14 do Acórdão recorrido de 20.09.2016, o Tribunal a quo decidiu que “a inter- pretação – subjacente ao Despacho recorrido – segundo a qual a nulidade formal do contrato de arrendamento que tem por objeto o imóvel expropriado (decorrente da sua não redução a escrito) priva o putativo arrendatário do direito a uma justa indemnização não viola o direito de propriedade privada consagrado no art. 62.º da CRP, nem o direito de indemnização consagrado em tal preceito, tão pouco ofendendo os princípios da proporcionalidade, da justiça e da igualdade consagrados nos arts. 13.º e 266.º da CRP”. […]”. 1.2.1. O recurso foi admitido no Tribunal da Relação de Lisboa, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo. 1.2.2. Notificadas as partes para apresentarem alegações, a recorrente ofereceu as suas, das quais consta, designadamente, o seguinte (transcrição parcial): “[…] 7.2 A questão que aqui se coloca é se, na perspetiva deste art. 62.º da Constituição, a não redução a escrito de um contrato de arrendamento poderá determinar que esse arrendatário não tenha direito a ser indemnizado pela entidade expropriante numa situação/relação expropriativa. Na leitura que fazemos, a Constituição não tolera uma situação assim configurada, designadamente pelas seguintes razões principais: a) em primeiro lugar, impõe-se uma ideia geral de hierarquização de valores jurídicos a tutelar, podendo facilmente concluir-se que um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, em particular o direito fundamental em que assenta a nossa ordem jurídica, social e económica (a proprie- dade privada), não poderá ceder perante a exigência de redução a escrito de um acordo verbal, em especial quanto a um contrato que as partes reconhecem e cumpriram durante mais de 3 anos; b) em segundo lugar, a lei só pode restringir direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou inte- resses legalmente protegidos (art. 18.º, n.º 1, da Constituição). Assim sendo, porque não se descortina que a Constituição preveja a restrição ( rectius , a ablação) do direito fundamental de propriedade privada/ justa indemnização aos arrendatários cujo contrato, embora reconhecido e vivido pelas partes durante 3 anos, não tenha sido reduzido a escrito, importa concluir que a norma sub judice não respeita esta garantia constitucional. De facto, nem essa exigência formal, nem os fins de certeza e segurança do comércio que se pretendem assegurar com essa exigência de forma escrita – ainda que tenham relevância constitucional –, têm aptidão para fazer extinguir os direitos fundamentais de propriedade privada e a uma justa indemnização em caso de expropriação por utilidade pública. Não ignorando a relevância constitucional dos fins de certeza e segurança do comércio que suportam a exi- gência de redução a escrito dos contratos de arrendamento, o que nos parece é que esses fins, neste tipo de situações, não são por qualquer forma prejudicados, pois, aspeto essencial, a própria Entidade Expropriante conhecia esta relação locatícia e reconheceu o direito da recorrente a uma justa indemnização, tendo-lhe para o efeito dirigido uma proposta indemnizatória (cfr., supra, n.º 4). Em suma, o reconhecimento do
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