TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
406 O pior é que não vemos maneira de interpretar este n.º 8 noutro sentido, designadamente de modo a admitir factos suspensivos ou interruptivos desse seu prazo, de que resulte ficar assegurado depender em último termo do titular do direito, exercê-lo ou não em tempo. De outro ponto de vista, também de justiça constitucional, a sobredita aleatoriedade resulta, em, perante os mesmos pressupostos substantivos de facto e de direito, sem causa de discriminação alguma que não o acaso, se denegar, potencial- mente, a uns trabalhadores e conferir a outros, uma prestação do Estado Social, ou seja, resulta numa ofensa do princípio e do direito Fundamental à igualdade de tratamento consagrado no artigo 13.º da Constituição. Mas, se assim é, este n.º 8 do artigo 2.º do novo regime do Fundo de Garantia salarial é materialmente inconstitu- cional, por ofensa do princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º, e do princípio da igualdade, consagrados no artigo 13.º, ambos da Constituição, pelo que tem de ser desaplicado em concreto. Desaplicado ele, não se pense que o sistema normativo que ele compunha redunda em alguma aporia de modo a não poder todo ele ser aplicado. Na verdade, na falta da bizarra norma do n.º 8 do artigo 2.º, sempre teremos, a limitar no tempo o exercício do direito ao pagamento de créditos salariais pelo Fundo, a norma geral da prescrição dos créditos labo- rais, precisamente um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessou o contrato – cf. artigo 337.º, n.º 1, do CT – esta, sim, suscetível das interrupções constituídas pela ação laboral e pela reclamação dos créditos na insolvência, interrupções indispensáveis para a reposição da justiça em face de um anormal atraso das decisões no processo de insolvência que são pressuposto da obrigação do Fundo. Como se provou, em 25/02/2015 foi instaurada ação laboral em que, além do mais, se reclamavam os créditos laborais junto da entidade patronal; e, em 05/11/2015, foram formalmente reclamados os mesmos créditos na insolvência entretanto declarada. Portanto, em 05/11/2015, quando os pedidos dos Autores ao Fundo foram apresentados, não estavam prescri- tos os créditos seu objeto, pelo que os Autores tinham e têm direito a que lhes sejam pagos pelo Réu. […]” (itálicos acrescentados). 1.2.1. Como intercalámos no texto da transcrição que antecede (remetendo precisamente para este item), a afirmação contida na sentença quanto à expressa assunção pelo Fundo, no acto impugnado, “[…] de que o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, cominado no n.º 8 do artigo 2.º do Regime do Fundo, é de caducidade e insusceptível de qualquer interrupção ou suspensão […]” (transcri- ção de fls. 167), decorre do elenco dos factos incluído na sentença (fls. 164/166 verso), concretamente dos pontos 7., 8., 9. e 10., que aqui se transcrevem: “[…] 7. Sobre os requerimentos [dos Autores] incidiu o seguinte parecer prévio da técnica […] da unidade de apoio jurídico ao Fundo, do Centro Distrital de Coimbra do ISS: ‘Esta proposta foi analisada à luz dos requisitos legais definidos no novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015 […], tais como: Verifica-se cumprido o requisito definido no n.º 1 do novo regime do Fundo de Garantia Salarial. Correm termos noTribunal Judicial de Coimbra os autos de processo de insolvência sob o n.º 2179/14.5TJCBR. A petição inicial deu entrada no dia 2014/10/07, tendo a sentença que declarou a insolvência sido proferida em 2015/03/17. Os requerimentos encontram-se devidamente instruídos, uma vez que foram certificados pelo Administrador da Insolvência, encontrando-se os créditos reconhecidos no mapa elaborado ao abrigo do artigo 129.º do CIRE, e foram acompanhados dos restantes elementos identificativos. Os requerimentos não foram apresentados no prazo de um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015 […]. Por tudo o que vem anteriormente referido, propõe-se o seguinte:
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