TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

403 acórdão n.º 328/18 X – Ao fazer nascer, ainda que potencialmente, na própria condição de realização de um direito a causa da sua extinção, à qual o titular se vê impossibilitado de obstar, o legislador deixa de conferir à retribuição a tutela que lhe era devida nos termos do artigo 59.º, n.º 3, da CRP; XI – Neste enquadramento, o próprio processo judicial apto a fazer nascer o direito constituiria causa da preclusão deste. Desta forma, potenciam-se diferenciações arbitrárias na concessão daquele direito a distintos titulares, subordinada que fica a efetividade deste à duração maior ou menor da fase inicial dos processos de insolvência, dependente de fatores alheios à vontade do trabalhador-credor; XII – Não se mostra irrelevante a pouca clareza do regime legal assim construído por via da interpretação conferida ao n.º 8 do artigo 2.º do NRFGS, considerada em si mesma ou sistematicamente inserida no diploma que a contém. Tal incerteza compromete seriamente a efetividade da tutela que corres- ponde ao mecanismo do FGS. O complexo normativo resultante do NRFGS, na referenciação nor- mativa aqui em causa, é apto a estas interpretações díspares, com uma consistência pouco definida, que induz sentidos pouco claros, geradores de situações de insegurança nos destinatários beneficiários do seu âmbito de proteção; XIII – Assim, está ferida de inconstitucionalidade a interpretação do artigo 2.º, n.º 8, do NRFGS, segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominada naquele preceito legal é de caducidade e, em função desta qualificação, nos termos do artigo 328.º do Código Civil, é insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão; XIV– Este entendimento da referida norma de direito interno, mostrando-se totalmente em linha com a jurisprudência constante do TJUE quanto ao condicionamento por prazos da obrigação de prote- ção aos créditos salariais, decorrente das Diretivas indicadas em I, mostra-se conforme ao Direito da União, nos termos em que este foi interpretativamente esclarecido, em termos inequívocos, pelo TJUE, assumindo esse entendimento, pois, na terminologia do acórdão Cilfit , de 6 de outubro de 1982 (respetivo ponto 14.), a natureza de “ato clarificado”; XV – Nestes casos (referindo-se a interpretação da norma de direito interno na sua relação com o Direito da União a um “ato clarificado”), nos termos do indicado acórdão Cilfit , ocorre dispensa da obrigação de reenvio interpretativo, decorrente do terceiro parágrafo do artigo 267.º do Tratado sobre o Fun- cionamento da União Europeia: obrigação de reenvio impendente sobre os órgãos jurisdicionais que (como sucede com o Tribunal Constitucional) julguem sem hipótese de recurso jurisdicional previsto no direito interno; XVI – Esta opção – a não realização, nestes casos, do reenvio – traduz a aplicação na ordem interna do Direi- to da União, nos exatos termos definidos por este, como impõe o trecho inicial do n.º 4 do artigo 8.º da CRP: “[a]s disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo Direito da União […]”.

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