TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
390 Porém, o uso do local arrendado pelo arrendatário, sem pagamento de renda, traduz.se num benefício ime- diato para este e, ao mesmo tempo, pode tratar-se de um prejuízo definitivo para o senhorio, o qual fica privado da posse do local, não dispondo dele para si próprio, nem para facultar a outrem, assim, se contrariando o escopo económico-social do instituto do arrendamento. Ou se admite tal incidente tal como está desenhado quanto à sua simplicidade, rapidez e eficácia ou, então, a sua admissibilidade não tem qualquer justificação. Se a ordem jurídica permitisse a existência desta prática, muitos arrendatários encontrariam neste mecanismo um meio fácil de usufruir de bens sem nada despenderem e o êxito de tais procedimentos tenderá sempre a angariar cada vez mais aderentes. XVIII Por outro lado, como bem lembra o Acórdão recorrido actualmente, nos termos do artigo 1069.º do Código Civil, os contratos de arrendamento estão obrigatoriamente sujeitos à forma escrita. Desta forma, tendo de existir contrato de arrendamento escrito, desde a entrada em vigor da nova redação do artigo 1069.º do Código Civil, introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, sob pena de não ser possível instaurar acção de despejo, então serão residuais e, por isso, desprezíveis, os casos em que surgirão arrendatários a invocar a «inexistência de um contrato de arrendamento válido» acompanhada de recusa de entrega do local ocupado, ou de «não serem autor elou réu os verdadeiros locador elou locatário», ou algum dissídio quanto ao montante da renda ou da sua imediata exigibilidade», ou, ainda, «invocação de diverso título para justificar a ocupação do local», hipóteses mencionadas no Acórdão n.º 673/05 proferido por este Tribunal Constitucional que os recorrentes invocam a seu favor.» Importa apreciar e decidir. II – Fundamentação 9. Como resulta do que se relatou, o objeto normativo do presente recurso é extraível do enunciado normativo constante do artigo 14.º, n.º 4, da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro [Novo Regime do Arrenda- mento Urbano (NRAU)], aplicado pelo tribunal recorrido na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, cujo teor é o seguinte: «Artigo 14.º Ação de despejo 1 – (…) 2 – (…) 3 – (…) 4 – Se as rendas, encargos ou despesas, vencidos por um período igual ou superior a dois meses, não forem pagos ou depositados, o arrendatário é notificado para, em 10 dias, proceder ao seu pagamento ou depósito e ainda da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que são contadas a final. 5 – Em caso de incumprimento pelo arrendatário do disposto no número anterior, o senhorio pode requerer o despejo imediato, aplicando-se, em caso de deferimento do requerimento, com as necessárias adaptações, o dis- posto no n.º 7 do artigo 15.º e nos artigos 15.º-J, 15.º-K e 15.º-M a 15.º-O.» 10. Nos termos do despacho de admissão do recurso proferido neste Tribunal, o objeto do presente recurso encontra-se circunscrito à interpretação do n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, segundo a qual se for requerido pelo autor o despejo imediato com fundamento em falta de pagamento de rendas vencidas na pendência da ação, o único meio de defesa do réu é a apresentação de prova, até ao termo
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