TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
389 acórdão n.º 327/18 Mas se um objecto não é susceptível de ser alcançado através de um certo processo, então tal processo carece de justificação e não deve ser sequer implementado, mal se compreenderia que, ao longo destes anos, tendo-se confrontado com esta problemática, o legislador ordinário, se entendesse que tal mecanismo legal era contrário ao direito de defesa consagrado constitucionalmente do inquilino relapso, não viesse por cobro ao mesmo, antes mantendo-o, continuamente, há dezenas e dezenas de anos. Pelo que, o entendimento expresso no douto Acórdão recorrido tem sido seguido, maioritariamente, pela doutrina e jurisprudência. Nesse sentido, o Acórdão do STJ de 09-10-2007, proferido no processo 07.ª2681 (Relator: Mário Cruz), sobre esta problemática concluiu: “O incidente da acção de despejo imediato por falta de pagamento de rendas na pendência da acção (previsto no artigo 58.º do RAU) admite apenas como forma de oposição relevante a prova do pagamento das rendas ou o seu depósito, nos termos gerais previstos no RAU. A não oposição ao incidente acarreta a confissão dos factos aí enunciados (artigo 303.º n. os 1 e 3 do CC), pelo que, se não for provado o pagamento das rendas vencidas ou efectuado o seu depósito nos termos exoneratórios, o despejo imediato será decretado. Enquanto não houver decisão a respeito da verificação da existência defeitos da coisa locada que não tenham sido previstas ou salvaguardadas no contrato e que possam legitimar a redução da renda, o único meio ao dispor do arrendatário para evitar o despejo por falta de pagamento de rendas no decurso da acção é o do pagamento ou depósito nos termos previstos no artigo 58.º do RAU”. Do mesmo modo, o acórdão do STJ de 05-12-2006, no processo 06.ª2299 (João Camilo), com factualidade próxima da constante dos presentes autos: O incidente da acção de despejo previsto no artigo 58.º do RAU, de despejo imediato por falta de pagamento das rendas vencidas na pendência da acção apenas admite como oposição relevante a prova do pagamento ou do depósito das rendas em falta. No mesmo sentido, ver ainda o acórdão do STJ de 15-12-2005, no processo 0583974 (Salvador da Costa), todos em www.dgsi.pt . XIV O incidente de despejo, por falta de pagamento das rendas vencidas no decurso da acção de despejo, destina-se ape- nas a obrigar o arrendatário a pagar ou então a depositar as rendas prevista no contrato à medida que se vão vencendo. XV Como já se referiu supra, os recorrentes tiveram, nos autos, oportunidade de se pronunciarem e defenderem quanto ao requerimento apresentado pelos recorridos e apresentarem as provas que reputassem convenientes, até porque nada na lei se opunha a que apresentassem tal defesa e, até, indicarem outras provas, que não aceites pelo tribunal a quo, sempre, poderiam impugnar, por meio de reclamação ou recurso tal despacho. O que não podiam era impugnar o despacho proferido, que, só por si, não implicava sequer o despejo do arrendado. XVI A Lei n.º 6/2006 procura combater as situações em que o arrendatário permanece na posse do local arrendado durante um, dois ou mais anos, sem pagar renda e quando finalmente o senhorio recupera o local, este corre o risco de nada receber porque nada consegue cobrar do arrendatário (veja-se o caso de uma empresa arrendatária que entretanto foi declarada insolvente). XVII Como bem frisa o douto Acórdão recorrido, se a ordem jurídica permitisse a existência desta prática, muitos arrendatários encontrariam neste mecanismo um meio fácil de usufruir de bens sem nada despenderem e o êxito de tais procedimentos tenderá sempre a angariar cada vez mais aderentes. Ademais, o arrendatário pode depositar a renda e este acto não implica a transferência do dinheiro para a esfera jurídica do senhorio, pois fica à ordem do tribunal, não existindo aqui um benefício imediato para o senhorio.
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