TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

388 VII No recurso que os recorrentes interpuseram desse despacho para o Tribunal da Relação do Porto alegando, em síntese, que por motivo atinente exclusivamente aos recorridos sofreram diminuição total do arrendado, em virtude de terem sido forçados ao seu encerramento em 31 de agosto de 2009, por o locado não possuir licença de utilização e necessitar de obras. Por isso, enquanto a situação se mantiver, é legítima a recusa do pagamento das rendas, não sendo de decretar o despejo do locado, VIII Não tendo, no caso dos autos, tal entendimento sido sufragado pelo Tribunal da Relação do Porto, vieram os recorrentes interpor recurso para este Tribunal Constitucional, pedindo que aquele normativo seja declarado inconstitucional, na interpretação segundo a qual se for requerido pelo autor o despejo imediato com fundamento em falta de pagamento de rendas vencidas na pendência da acção, o único meio de defesa é a apresentação de prova, até ao termo do prazo para a sua resposta, de que procedeu ao pagamento ou depósito das rendas em mora e da importância da indemnização devida. IX Estão convictos os recorrentes que, o Tribunal da Relação do Porto, ao considerar, no seu Acórdão, que tal norma não está ferida de inconstitucionalidade material por não violar o princípio da proibição da indefesa, ínsito no artigo 20.º da Constituição da República, decidiram conforme o direito, conforme o contexto social em que se enquadra a actual ordem jurídica, o sentimento de justiça geral e segundo o justo equilíbrio e ponderação de interesses que tal norma tem por principal escopo. X O n.º 3 do artigo 14.º da Lei 6/2006 de 27/02 dispõe: Na pendência da acção de despejo, as rendas que se forem vencendo devem ser pagas ou depositadas, nos termos gerais. XI Por sua vez, o seu n.º 4 estatui: Se as rendas, encargos ou despesas, vencidos por um período igual ou superior a dois meses, não forem pagos ou depositados, o arrendatário é notificado para, em 10 dias, proceder ao seu paga- mento ou depósito e ainda da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que são contadas a final. XII A razão de ser ou o fundamento jurídico do despejo imediato consistiu e consiste em evitar situações em que o arrendatário, demandado em juízo pelo senhorio, poderia continuar a gozar da coisa arrendada sem pagar a renda estipulada, podendo tal situação arrastar-se por vários anos, desde a instauração da acção até à execução da sentença transitada em julgado, após um ou mais recursos. A forma de pôr termo a tais acções abusivas dos arrendatários e de evitar uma disseminação de tal comporta- mento, consistiu precisamente na possibilidade de ser obtido o despejo imediato por falta de pagamento das rendas vencidas durante a pendência do processo. Entendida como inútil, esse incidente não se distinguiria da acção declarativa de despejo e não passaria de uma duplicação de acções numa só acção. XIII Se fossem admitidos outros fundamentos de oposição, o incidente apenas produziria uma maior complexidade processual e o seu objectivo (impedimento do gozo da coisa pelo arrendatário sem dispêndio de dinheiro por parte deste durante largo tempo, inclusive anos), não seria alcançado.

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