TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

377 acórdão n.º 309/18 o Estado promete a concessão de benefícios fiscais a quem investir de determinada maneira é legítimo que o investidor confie que as “regras do jogo” não sejam mudadas antes do aproveitamento dos benefícios em fun- ção dos quais se movimentou. De modo que a legitimidade das expectativas criadas pelo Estado justifica-se e explica-se racionalmente por referência à relação que neste tipo de benefícios se estabelece entre as vantagens atribuídas e as atividades estimuladas. A atuação em termos de causa-efeito, «como um “ante” causal, face a situações futuras que pretendem estimular» (Nuno Sá Gomes), proporciona ao contribuinte previsão de continuidade e ultractividade da base normativa que o levou a investir. É na perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual que os contribuintes planeiam e efetuam os investimentos relevantes para que seja concedida a vantagem tributária. Sem a preservação da “base de confiança” revelada pelo RFAI, os contribuintes não seriam motivados a cooperar com o Estado nas finalida- des extrafiscais por ele visadas. A atividade prévia desempenhada pelo contribuinte para o gozo do benefício fiscal assume, assim, particular relevância na proteção da confiança. Para aproveitar o benefício “oferecido” pelo Estado, o contribuinte realiza antecipadamente investimentos que implicam custos financeiros, e dos quais espera ter retorno. Naturalmente que os contribuintes visam a racionalidade da gestão da sua atividade económica através da minimização dos custos comerciais, industriais, financeiros e fiscais. A sua escolha dependerá dos cálculos do capital a investir e da rentabilidade esperada dos investimentos projetados. Ora, a motivação dessa escolha não pode deixar de levar em consideração o contexto normativo tributário em que os investimentos vão ser realizados. O fator fiscal está intrínseco ao RFAI: o Estado oferece aos contribuintes uma poupança fiscal em sede de IRC na condição de realizarem investimentos relevantes em determinadas regiões do país. Neste contexto, é de admitir, com certeza, que os contribuintes só realizam os investimentos tendo em conta a perspetiva de continuidade da redução da carga fiscal que o RFAI proporciona. Por esta razão, pode dizer-se que os benefícios fiscais decorrentes do RFAI constituem necessariamente a justificação da opção pela realização de “disposições” – financiamentos, despesas, recursos, património, planos económi- cos desaproveitados, custos de oportunidade, etc. – que consubstanciam “investimentos na confiança” da manutenção do regime legal vigente. O carácter oneroso, condicionado e temporário do benefício fiscal, na modalidade de dedução à coleta, previsto no RFAI, dá uma indicação segura ao contribuinte de que o legislador, após o investimento efetuado, se absterá de alterar as condições em que o mesmo foi concedido. 16. Verificados os três requisitos ou “testes” que concretizam o parâmetro jurídico-constitucional da «confiança», a respetiva tutela depende ainda de não ocorrem razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa dos investidores. No caso da norma questionada, o contrapólo valorativo consubstancia-se nos interesses públicos que fundamentam a necessidade de adoção de medidas de consolidação orçamental, de redução e racionalização da despesa pública, e a maior equidade tributária. O artigo 92.º do CIRC, ao estabelecer um limite à redução da taxa efetiva de tributação por utilização de benefícios fiscais, assegura não só um limiar mínimo de IRC a pagar em cada ano, como contribui também para uma distribuição equitativa da carga do imposto. De facto, a imposição de limites à utilização de benefícios fiscais tem por primeiro objetivo a redução das «des- pesas fiscais», com o consequente aumento de receita fiscal. Mas também se traduz em diminuir no plano da equidade as consequências negativas que os benefícios causam na distribuição da carga do imposto sobre o rendimento entre os diferentes beneficiários. A fixação de um limite à redução da taxa efetiva de tributação por utilização de benefícios fiscais também releva no plano da igualdade entre beneficiários, evitando distor- ções das regras de funcionamento normal da vida económica.  A decisão arbitral recorrida deu prevalência à satisfação desses interesses públicos sobre as expectativas dos contribuintes na continuidade das regras do RFAI. Na ponderação que efetuou de acordo com os crité- rios do princípio da proibição do excesso, julgou que não pode considerar-se inadequada a diminuição da relevância dos benefícios fiscais que se concretizou no artigo 92.º, n.º 1, do CIRC, tendo em consideração o contexto de crise das finanças públicas que se vivia em 2011, com sujeição às consequências do resgate

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