TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
375 acórdão n.º 309/18 retroativa dessa norma, independentemente da sua categorização (retroatividade ou retrospetividade), deve ser apreciada e confrontada com os limites que o princípio de proteção da confiança impõe à retroatividade das normas fiscais. 13. OTribunal Constitucional tem constantemente afirmado que o princípio de proteção da confiança, ancorado no artigo 2.º da CRP, não exclui em absoluto a possibilidade de leis fiscais retroativas, excluindo-as apenas quando se esteja perante uma retroatividade intolerável, que afete de forma inadmissível, arbitrária e demasiado onerosa as expectativas legitimamente fundadas dos contribuintes. Assim, como logo se afirmou no Acórdão n.º 287/90, não existe «um direito à não-frustração de expec- tativas jurídicas ou a manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados». De modo que o legislador não está impedido de alterar o sistema legal afetando relações jurídicas já constituídas e que ainda subsistam no momento em que é emitida a nova regu- lamentação, sendo essa uma necessária decorrência da autorevisibilidade das leis. O que se impõe determinar é se poderá haver por parte dos sujeitos de direito um investimento de confiança na manutenção do regime legal (Acórdão n.º 188/09). Se bem que a aplicação do princípio da proteção da confiança depende, necessariamente, do confronto entre a finalidade de interesse público e as expectativas frustradas pela medida em causa, para aferir da exis- tência de uma “situação de confiança” e do “investimento na confiança”, importa ter presente o método que a jurisprudência constitucional adota quando procede à ponderação desses interesses. De acordo com essa jurisprudência, para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da confiança é necessário: em primeiro lugar, que as expectativas de estabilidade do regime jurídico em causa tenham sido induzidas por comportamentos dos poderes públicos; que elas sejam legítimas, ou seja, fundadas em boas razões, a avaliar no quadro axiológico jurídico-constitucional; por fim, o cidadão deve ter orientado a sua vida e feito opções, precisamente, com base em expectativas de manutenção do quadro jurídico. Dados por verificados esses requisitos cumulativos, há que proceder a um balanceamento ou ponderação entre os inte- resses particulares desfavoravelmente afetados pela alteração do quadro normativo que os regula e o interesse público que justifica essa alteração. Com efeito, para que a situação de confiança seja constitucionalmente protegida, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa (Acórdãos n. os 287/90, 128/09, 399/10, 396/11, 353/12, 187/13, 474/13, 602/13, 794/13 e 862/13). 14. No caso sub judicio , as peculiares características do benefício fiscal em causa e do seu modo de funcionamento – condicional, temporário, dinâmico e bilateral – motivam uma proteção mais intensa à confiança depositada na manutenção do benefício. De facto, se o benefício é concedido para estimular com- portamentos futuros, mediante certas condições e por prazo certo, é evidente que o contribuinte que atua satisfazendo tais condições tem a esperança de vir alcançar o benefício que determinou a sua atuação. É o carácter temporário e condicionado dos benefícios fiscais que justifica limitações legais à livre modi- ficabilidade ou revogabilidade de normas que regulam benefícios fiscais. No n.º 2 do artigo 3.º e no n.º 1 do artigo 11.º do EBF, que versam sobre a caducidade e a aplicação no tempo de normas sobre benefícios fiscais, ressalvam-se os “direitos adquiridos” durante o prazo de vigência das normas que concedem benefícios fiscais temporários e condicionais, a fim de proteger a situação de confiança dos sujeitos passivos que realizaram disposições estimuladas por esses benefícios. A fixação do “prazo” assegura a previsibilidade do gozo do benefício, delimitando, no tempo, a situação jurídica individualizada que caracteriza o direito ao benefício; e a exigência de “condições” para a concessão do benefício revela, por si só, a existência de investimentos na confiança, que é requisito essencial à proteção da confiança. De igual modo, nesta matéria, a doutrina regista que os benefícios fiscais temporários e condicionados geram situações jurídicas individualizadas que não podem ser prejudicadas pela interferência de alterações normativas posteriores. Em relação às “isenções temporárias”, um dos tipos de benefícios fiscais previstos na
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