TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
367 acórdão n.º 309/18 Sendo assim, apreciando a questão à face da situação da Requerente, relativamente ao benefício que poderia advir dos investimentos realizados em 2011, não se vislumbra como pode haver frustração de expectativas por alteração do regime legal, pois a alteração foi efetuada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, publicada antes de os investimentos terem sido realizados. No que concerne ao reporte em 2011 de benefício fiscal derivado de investimentos realizados no ano de 2010, é certo que ocorreu a diminuição do montante do benefício fiscal proveniente do RFAI que pode ser deduzido em 2011, mas isso nem significa que o benefício fiscal não tenha sido aproveitado nos exercícios dos anos subsequentes e pode sê-lo até ao exercício de 2015. Por outro lado, aplicando-se o regime da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, aos rendimentos gerados em 2011, a sua validade não é afetada pela proibição constitucional de retroatividade, com o sentido restrito que lhe tem dado o Tribunal Constitucional, que é o de que «o legislador da revisão apenas pretendeu incluir, no n.º 3 do artigo 103.º da CRP, a proibição da retroatividade autêntica, própria ou perfeita da lei fiscal, o que não é contra- riado pela letra do preceito, uma vez que o texto constitucional apenas se refere à natureza retroativa tout court. Por outro lado, resulta igualmente dos trabalhos preparatórios, de forma cristalina, que não se pretenderam integrar no preceito as situações em que o facto tributário que a lei nova pretende regular não ocorreu totalmente ao abrigo da lei antiga, antes continuando a formar-se na vigência da lei nova, pelo menos, quando estão em causa impostos diretos relativos ao rendimento (como é claramente o caso dos presentes autos)». Fora do âmbito da retroatividade autêntica, a proteção da confiança na manutenção de um determinado regime fiscal, apenas será incompatível com o princípio do Estado de direito democrático quando for material- mente injustificada e não ocorrerem razões de interesse geral que reclamem a alteração legislativa e o encargo para o contribuinte não se mostrar desproporcionado. Ora, tendo em consideração o contexto de enorme crise das finanças públicas, que é consabido que se vivia em 2011, em que o país estava sujeito às consequências de um resgate financeiro que lhe impunha o acatamento cons- tante da pressão dos credores internacionais, que impunham uma rápida redução do défice das finanças públicas, não pode considerar-se inadequada a diminuição da relevância dos benefícios fiscais que se concretizou no artigo 92.º, n.º 1, do CIRC. Na verdade, sendo uma realidade indelével a necessidade de rápida obtenção de receitas fiscais, é menos gra- voso, a nível da frustração de expectativas em matéria de tributação do rendimento, reduzir benefícios fiscais do que agravar a normal tributação dos rendimentos, pois aqueles configuram situações de discriminação positiva em relação generalidade dos cidadãos, a nível do princípio básico da tributação do rendimento, que é o da capacidade contributiva. Por isso, a Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, ao alterar o artigo 92.º do CIRC não viola o princípio constitucional da confiança, nem a regra do artigo 11.º, n.º 1, da LGT. Conclui-se, assim, que, no exercício de 2011, a Requerente deveria ter observado o limite de 10% estabelecido no art. 92.º, n.º 1, CIRC, não podendo esse limite ser ultrapassado dado que o RFAI não estava contemplado no n.º 2 do mesmo artigo e que a limitação efetuada pela Lei n.º 55-A/2010 à relevância de benefícios fiscais não afeta qualquer princípio constitucional, designadamente os invocados pela Requerente». 8. Importa, desde logo, assinalar que não compete ao Tribunal Constitucional tomar posição sobre a correção ou incorreção da interpretação normativa efetuada na decisão recorrida, designadamente sobre se, no plano do direito infraconstitucional, a correta interpretação a fazer do n.º 1 do artigo 92.º do CIRC é a que é defendida pela Administração Tributária e acolhida pelo tribunal arbitral, ou antes a que é sustentada pela recorrente. Ao Tribunal compete apenas decidir sobre a conformidade da interpretação normativa, assim efetuada, com a Constituição. Na versão aplicada na decisão recorrida, o artigo 92.º do CIRC, sob a epígrafe «resultado da liquidação», dispunha o seguinte:
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