TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

366 A recorrente impugnou junto do Tribunal Arbitral a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2011 invocando, na parte que interessa à apreciação da questão de constitucionalidade, que o limiar mínimo de IRC constante do n.º 1 do artigo 92.º do CIRC, na redação que foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, não se aplica aos benefícios fiscais previstos no RFAI por investimentos realizados em 2009 e 2010. Apoiando-se em parecer jurídico junto aos autos, sustentou que “não é interpretação juridicamente aceitável” defender que o crédito de imposto em sede de RFAI, utilizável até à concorrência de 25% da coleta do IRC, previsto na alínea a) , do n.º 1, do artigo 3.º do RFAI, não pode ser utilizado dentro dessa margem, em razão da margem mais genérica de apenas 10% constante do artigo 92.º do CIRC, na redação em vigor em 2011. Após expor os fatores hermenêuticos que conduzem à interpretação do n.º 1 do artigo 92.º do CIRC no sentido excluir o RFAI do âmbito da sua aplicação, alegou no pedido de constituição arbitral (artigo 50.º) que a interpretação desse preceito no sentido de incluir os benefícios fiscais em sede de RFAI relativos a investimentos realizados em 2009 e 2010 afronta o princípio constitucional da proteção da confiança. Efetivamente, a decisão arbitral recorrida interpretou e aplicou o n.º 1 do artigo 92.º do CIRC no sen- tido de sujeitar o RFAI ao limite máximo anual de 10% da coleta de IRC para utilização de benefícios fiscais não excetuados no seu n.º 2. E quanto ao princípio da proteção da confiança, a decisão arbitral recorrida refere o seguinte: «No que concerne ao princípio da confiança e da boa fé, que a Requerente identifica como subjacente ao artigo 11.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e como concretização do princípio constitucional da proteção da confiança que se retira do artigo 2.º (Estado de Direito) da Constituição, o que aí se estabelece, no que aqui interessa, é que «as normas que alterem benefícios fiscais convencionais, condicionados ou temporários, não são aplicáveis aos contribuintes que já aproveitem do direito ao benefício fiscal respetivo, em tudo que os prejudique, salvo quando a lei dispuser em contrário». No entanto, para além de esta mesma norma ressalvar a possibilidade de a lei dispor em contrário, o aproveita- mento dos benefícios fiscais que este artigo 11.º visa assegurar só ocorre quando se concretizam todas as condições para que o contribuinte dele possa usufruir. Designadamente, no que concerne ao RFAI e em matéria de IRC, é condição do aproveitamento do benefício fiscal que haja coleta de IRC suficiente, no ano em que ocorreu o investimento ou nos quatro períodos subsequentes. Ora a coleta futura é, naturalmente, algo de imprevisível, pois depende, desde logo, do volume dos lucros que venham a ser obtidos nos anos futuros. Para além disso, já desde a Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro, que os benefícios fiscais na modalidade de dedução à coleta, como é o caso de RFAI, estavam sujeitos, com outros, à limitação global prevista no artigo 86.º do CIRC, a que veio a corresponder o artigo 92.º, após a renumeração operada pelo 92.º do CIRC, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho. Por isso, não há fundamento para considerar que a realização de um investimento dentro do circunstancialismo previsto no RFAI implicava um direito ao aproveitamento do benefício fiscal previsto em sede de IRC, pois esse direito só se viria ou não a consolidar na esfera jurídica dos contribuintes se se viesse gerar coleta suficiente num dos exercícios em que tal aproveitamento podia ter lugar e se não se viesse a verificar que a soma do montante do benefício fiscal do RFAI com o montante dos outros benefícios fiscais identificados no n.º 2, excedia o respetivo limite previsto no referido artigo 86.º e, posteriormente, no artigo 92.º, limite esse que que era inicialmente de 40% (até 60% de coleta assegurada), passou para 25% com a Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, e foi reduzido para 10% com a Lei n.º 55-A/2010. Assim, a realização de um investimento suscetível de proporcionar um benefício fiscal ao abrigo do RFAI 2009 não podia criar no investidor mais que uma mera expectativa de que poderia vir a usufruir de um benefício fiscal em matéria de IRC baseado nesse investimento, expectativa essa que só seria transformada num direito no exercício em que concretiza o investimento ou num ou mais dos quatros exercícios seguintes, se, eventualmente, se verifica- rem as condições para o seu aproveitamento.

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