TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

347 acórdão n.º 308/18 biológico em que medraram, estão condenados a perecer; conservar a paternidade contra a vontade do impugnante não é dar prevalência a uma «verdade sociológica» − irremediavelmente perdida –, mas depositar expectativas insólitas na força emocional do vínculo jurídico. Neste contexto, o direito à família e à proteção na infância do filho têm um peso diminuído por factos incontornáveis e inelimináveis. A tudo isto acresce que nos situamos agora num domínio em que o legislador goza de liberdade dilatada de conformação política, solidamente ancorada no princípio democrático. Um juízo de inconstitucionali- dade teria de passar pela demonstração de que a solução encontrada pelo legislador é manifestamente despro- porcionada. Ora, não é esse o caso – o regime vigente, não sendo porventura o único admissível, constitui uma resposta equilibrada para um problema melindroso, devendo ser respeitado e aplicado pelos tribunais, quaisquer que sejam as opiniões de cada juiz sobre o mérito da lei. Resta julgar o recurso procedente, no que respeita à norma, extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1842.º do Código Civil, que estabelece que a ação de impugnação da paternidade pode ser intentada pelo marido da mãe no prazo de três anos desde que teve conhecimento das circunstâncias de que possa concluir- -se a sua não paternidade. 12. Tratando-se de recurso ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, não há lugar ao paga- mento de custas. III – Decisão Em face do exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e da proibição de discriminação dos filhos nascidos fora do casamento, consagrados nos artigos 13.º e 36.º, n.º 4, da Constituição, a norma, extraída do n.º 2 do artigo 1859.º do Código Civil, que estabelece que a ação de impugna- ção da perfilhação pode ser intentada pelo perfilhante a todo o tempo. b) Não julgar inconstitucional a norma, extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1842.º do Código Civil, que estabelece que a ação de impugnação da paternidade pode ser intentada pelo marido da mãe no prazo de três anos desde que teve conhecimento das circunstâncias de que possa concluir a sua não paternidade, não obstante a verificação de posse de estado de filiação (consolidados laços familiares entre o impugnante e o filho). c) Em consequência, conceder provimento parcial ao recurso. d) Ordenar a reforma da decisão recorrida, em conformidade com o juízo de não inconstitucionali- dade formulado na alínea b) . Não são devidas custas. Lisboa, 7 de junho de 2018. – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Joana Fernandes Costa – Maria José Rangel de Mesquita (vencida, nos termos da declaração anexa) – Lino Rodrigues Ribeiro [vencido quanto à alínea a) , conforme declaração junta] – João Pedro Caupers. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida quanto à decisão de julgamento da inconstitucionalidade constante da alínea a) da Decisão, e respetiva fundamentação (cfr. II, 6. a 10.) – relativa à norma extraída do n.º 2 do artigo 1859.º do Código Civil, que estabelece que a ação de impugnação da perfilhação pode ser intentada pelo perfilhante a todo o tempo –, pelas razões que de seguida sucintamente se enunciam.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=