TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

333 acórdão n.º 308/18 ainda por violação do direito constitucional à família consagrado no artigo 67.º da CRP que assegura que a família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à proteção da sociedade e do Estado e à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros e finalmente por violação da proteção Consti- tucional da Infância – art. 69.º da CRP. Viola o princípio da igualdade e da não discriminação de filhos nascidos fora do casamento na medida em que estabelece sem qualquer razão material que justifique a discriminação, um regime diverso do previsto em matéria de prazo de caducidade da ação de impugnação da paternidade para os filhos nascidos no casamento por iniciativa do pretenso pai – art. 1842.º n.º 1 a) do CCivil – discriminação (negativa) unicamente assente no facto do visado não ter nascido do casamento dos seus pais ou melhor de não ter nascido de pais casados. Efetivamente em ambas as situações o direito que o autor pretende exercer, ao querer afastar a sua paternidade, é o mesmo e os interesses e direitos do filho são exatamente os mesmos. Contra não se diga que na perfilhação se trata de um ato voluntário cujos pressupostos podem estar viciados por erro ou dolo; É que também na paternidade afirmada por presunção fundada no casamento pode ter existido erro ou dolo. Viola por outro lado o direito à família (desde logo quanto à liberdade de constituição de família pelas várias moda- lidades legalmente admissíveis e não só pelo casamento) mas também a própria proteção da família enquanto centro de afetos e de organização social estável. Por outro lado, viola também o direito constitucional à proteção da infância ao prever de modo absolutamente incondicionado a possibilidade de ser afastada por iniciativa alheia ao filho uma pater- nidade afetivamente consolidada durante vários anos, destruindo assim a (única) referência familiar do filho menor de idade privando-o do desenvolvimento tendencialmente harmonioso que a família assegura ou, ao menos, potencia.  Afastada nos termos expostos, por inconstitucionalidade, a referida norma importaria aplicar ainda dentro do sistema normativo em causa uma solução constitucionalmente viável, a aplicação de uma outra norma, por analogia, ainda conforme à Constituição. Ora, quanto ao primeiro segmento da declarada inconstitucionalidade – por violação da igualdade e proibição de discriminação – a solução poderia ser encontrada no também aludido artigo 1842.º n.º 1 a) do CCivil, apli- cando, por analogia, à impugnação da filiação o prazo de caducidade previsto para a impugnação da paternidade por iniciativa do pai decorrente da presunção por casamento dos pais. A impugnação da perfilhação por parte do perfilhante teria assim o prazo de caducidade de 3 anos contados do momento em que tivesse conhecimento de factos que colocassem em dúvida a sua paternidade. Não obstante a aplicação da referida norma já não resiste ao crivo constitucional decorrente da aplicação do segundo dos convocados fundamentos de desconformidade à Constituição – violação da proteção Constitucional da Proteção da Família e da Infância. Efetivamente, também a norma em causa – art. 1842.º n.º 1 a) do CC – deve ser considerada inconstitucional sob este prisma e precisamente pelas mesmas razões já explicitadas: Também na impugnação da paternidade fundada em presunção do casamento dos pais não se tem minima- mente em conta a consolidação das relações familiares mas apenas a prevenção de situações de abuso de direito nos casos em que, sendo já conhecedor de factos que fizessem duvidar da paternidade, o declarado pai não atue nos 3 anos subsequentes. Em todo o caso, está bem de ver que o aludido prazo, dado o seu termo inicial – apenas centrado no pretenso pai –, pode iniciar-se já com muitos anos passados de vinculação afetiva e de situação familiar consolidada com o filho, assim se desrespeitando o direito da criança ou do jovem a crescer com certa identidade e suporte familiar. É esta, aliás, a situação que ocorre no caso dos autos: A 2.ª R tem atualmente 17 anos (15 anos à data da entrada da PI) e, não obstante, o A estaria em tempo de impugnar a sua paternidade mesmo aplicando ao caso o artigo 1842 n.º 1 a) agora também em causa pois que não teve conhecimento da sua infertilidade há mais de 3 anos. O artigo 1842.º n.º 1 a) do CCivil ao prever um prazo de caducidade com termo inicial a partir do conheci- mento dos factos que fazem duvidar da paternidade independentemente de se terem já nessa altura consolidado laços familiares entre o declarado pai e o filho deve, assim, também, considerar-se inconstitucional por violação do direito à Família e da proteção da Infância garantidos nos termos dos convocados artigos 67.º e 69.º da CRP. Do exposto, nomeadamente dos dois explicitados juízos de inconstitucionalidade material resulta a conclusão interpretativa de verificação de uma lacuna, pelo que a solução constitucionalmente conforme será, com recurso ao

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