TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
298 condições de acesso das entidades beneficiárias – como se propunha – antes sim introduziu na ordem jurídica algo que dela não decorria: a exclusão, entre outras, da atividade agrícola no que tange aos benefícios à inte- rioridade. P’ – Dir-se-á que tal exclusão da agricultura, até ao ato normativo em causa, não só não era certa, como aliás nem sequer existia na ordem jurídica; desta forma, a nova lei nada veio confirmar ou regulamentar, antes sim ino- var, pelo que se impõe a consideração da sua ilegalidade, por inconstitucional, Q’ – Consequentemente, ilegal e inconstitucional será a liquidação impugnada nos autos, porquanto é sustentada e fundamentada nas invocadas normas que padecem do referido vício. R’ – Temos ainda a considerar a questão do conflito de normas, sendo que, por força do já aludido n.º 2 do Art.º 8.º do DL 55/2008, a repristinação da Portaria 170/2002 origina um óbvio conflito hierárquico de normas. S’ – Quando o Governo aprova um determinado Decreto-Lei e este contraria uma norma constitucional, verifica-se uma inconstitucionalidade (porque as normas constitucionais têm um valor superior à legislação ordinária). T’ – E um regulamento do Governo, ou seja, uma portaria tem menos valor hierárquico que um decreto-lei, o que significa que se uma portaria contraria um decreto-lei, esta portaria é ilegal. U’ – A Lei e o Decreto-Lei têm igual valor (em termos de hierarquia dos atos normativos), e isso mesmo é confir- mado pelo Art.º 112.º, 2, da Constituição da República Portuguesa: “As leis e os decretos-leis têm igual valor (...)” V’ – Quando um conflito ocorre entre normas com graus hierárquicos distintos, onde o conflito é dirimido por recurso ao Critério Hierárquico – consiste na preferência dada, em caso de antinomia, a uma norma por- tadora de status hierarquicamente superior ao seu par antinómico, comummente refletido no princípio “ lex superior derogat legi inferion ”, X’ – A norma do n.º 2 do Art.º 8.º D.L. 55/2008 ao repor a vigência da Portaria 170/2002, e consequentemente, ao derrogar o benefício fiscal à atividade agrícola exercida pela Recorrida, [viola] claramente os aludidos princípios constitucionais, mormente o da hierarquia das normas, pelo que, por mais tal motivo acrescido, se impõe também a anulação da liquidação impugnada baseada em tais ilegalidades, Z’ – Constitui fundamento de impugnação, entre outros – ex vi Art.º 99.º CPPT – qualquer ilegalidade, pelo que, considerando os vícios invocados, procedeu e bem a impugnação, assim como deverá manter-se a decisão recorrida nesta sede constitucional por não merecer qualquer juízo de censura. A” – A AT veio, em sede de contestação, e que agora repete, nitidamente emendar a mão, e pretende justificar e fundamentar, naquela fase contenciosa de apreciação da constitucionalidade, aduzindo argumentos que não constam da fundamentação do ato tributário impugnado. B” – Ora, no caso dos autos, e compulsada a posição assumida pela AT, verificamos que quer na contestação deduzida, quer nas alegações que produz nesta sede constitucional, esta veio invocar fundamentos e motiva- ções que não constam sequer do iter cognoscitivo que plasmou no relatório com as correções propostas, onde fundou a pretensão de corrigir a matéria tributável no facto de o sujeito passivo exercer atividade agrícola, circunstância que à luz da Portaria 170/2002, de 28 de fevereiro, a afasta de tal benefício. C”– Nas alegações produzidas, vem aduzir-se argumentos fundamentantes completamente novos, o que não deixa de constituir uma autêntica motivação a posteriori, a qual não é admissível D”– Esta é uma motivação a posteriori, não contextual, que, por não assegurar a respetiva genuinidade, não cum- pre as exigências do dever legal de fundamentar – Cfr. Vieira de Andrade, in O Dever de Fundamentação Expressa de Atos Administrativos , pp. 39-43 e, entre outros, o acórdão STA de 2005.07.12 – Rec. n.º 158/03. E” – A AT deveria ter dado a conhecer ao sujeito passivo efetivamente como procedeu às correções, bem como quais as razões de direito, em que normas ou princípios se alicerçou para optar pela correção impugnada; a AT não o fez oportunamente ou pelo menos de forma insuficiente, vindo a fazê-lo apenas na sequência do pedido de constituição do tribunal arbitral e agora, novamente, nesta sede constitucional.
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