TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

29 acórdão n.º 420/18 Na realidade, a preocupação de criação de um quadro unitário na definição do regime e dos critérios (ainda que mínimos) de acesso dos consumidores finais a uma tarifa reduzida na prestação dos serviços de águas pode ser compreendida pelo facto de a previsão e regulação de tarifas sociais (e de tarifas familiares) no domínio da prestação de serviços de abastecimento de água às populações encontrar já consagração, de forma dispersa e diversificada, nos tarifários estabelecidos e praticados por vários municípios, enquanto prestadores dos serviços referidos às populações locais, dependendo, assim, das opções (com inegáveis repercussões finan- ceiras) adotadas pelos competentes órgãos locais. Deste modo, e pese embora – como assinalado, aliás, pelo requerente (cfr. pedido, II[I], n.º 20) – o artigo 67.º da LOE para 2017 não indicar a específica matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República subjacente à autorização legislativa integrada na proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2017 elaborada pelo Governo e por este apresentada à Assembleia da República, o objeto da autorização legislativa, na parte em que se refere à criação de um regime que vise a atribuição de tarifas sociais para a prestação dos serviços de águas pelo município territorialmente competente (cfr. n.º 1 do artigo 67.º) indicia com elevado grau de segurança que o regime a aprovar com base na autorização legislativa concedida pela LOE para 2017 teria implicações em matéria de estatuto (atribuições e competências) dos municípios, incluindo no que respeita às finanças municipais e, assim, das autarquias locais. E, acrescidamente, idêntica conclusão decorre da parte da norma que, versando sobre o sentido e a extensão da autorização legislativa, concretamente prevê que compete aos municípios que voluntariamente aderirem ao regime de tarifa social para o fornecimento de serviços de água o seu financiamento [cfr n.º 2, alínea d) , do artigo 67.º] – assim apresentando implicações com o regime das finanças locais, no que aos municípios diz respeito. Isto tendo em conta que, sendo o custo da atribuição da tarifa social em causa suportado pelo município aderente – na modalidade de aplicação de um desconto e ou de isenção de tarifas – tal financiamento onera necessaria- mente as finanças locais, quer se traduza na redução de receita ou na não perceção de uma receita (desde logo no caso de a prestação dos serviços de águas ser assegurada pelo próprio município aderente), quer se traduza num incremento, maior ou menor (consoante se trate de aplicação de um desconto ou de isenção), de des- pesa (quando a prestação dos serviços de águas seja assegurada por entidade distinta do município aderente). Com efeito, o regime em questão, aprovado ao abrigo da autorização legislativa concedida pela LOE para 2017, apresenta um conjunto de traços caracterizadores principais de que se destacam especialmente, com relevância para os presentes autos – na medida em que expressamente prevêem a intervenção dos muni- cípios (e de todos os municípios), cometendo aos respetivos órgãos representativos (assembleia municipal e câmara municipal) um conjunto alargado de competências e responsabilidades na matéria –, os seguintes: i) a aprovação de tarifa social para a prestação dos serviços de águas (tarifa social) compete ao municí- pio territorialmente competente, sendo atribuída a clientes finais do fornecimento dos serviços de águas (no território nacional) – abrangendo os serviços de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais (artigo 1.º «Objeto e âmbito»); ii) os clientes finais elegíveis são pessoas singulares com contrato de fornecimento de serviços de águas e que se encontrem em situação de carência económica, de acordo com os critérios fixados pelo diploma (artigo 2.º, n.º 1 e n. os 2, 3, 6 e 7); iii) aos municípios é atribuída competência para estabelecer, mediante deliberação da assembleia muni- cipal, outros critérios de referência para o acesso à tarifa social, desde que não sejam restritivos em relação aos previstos no diploma (ou seja, mais abrangentes, como mencionado no preâmbulo do diploma) – os quais são objeto de publicitação nos termos aí previstos (artigo 2.º, n. os 4 e 5); iv) a adesão dos municípios ao regime de tarifa social é voluntária, mediante deliberação da assembleia municipal sob proposta da câmara municipal (artigo 3.º, n.º 1) – competência que não resulta pre- judicada pela prestação de serviços de águas por entidade distinta do município (artigo 3.º, n. os  2 e 3) – e, quando objeto de decisão, é publicitada (artigo 10.º, n.º 1);

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