TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

288 prévias ou incidentais suscetíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar». Este regime evidencia a natureza intrinsecamente provisória do juízo indiciário formulado no despacho de pronúncia, o qual se destina a definir o objeto do julgamento a realizar necessariamente pelo Tribunal de julga- mento. Numa outra perspetiva, não deve, tão-pouco, perder-se de vista que a pronúncia desempenha uma função de garantia, visando impedir que o arguido seja submetido a julgamento sem que haja motivo sério para tanto, não significando, de modo algum, uma antecipação do juízo de condenação do arguido (Acórdão n.º 124/90). A instrução deve, portanto, ser vista como uma fase processual que visa obter uma decisão final jurisdicional, configurando uma situação diversa daquela a que se reporta a sentença penal, já que, nos casos em que traduza decisão judicial de pronúncia, esta se queda na emissão de um juízo necessariamente indiciário e por natureza provisório de conteúdo não condenatório.» 21.3. Acresce que os poderes do julgador igualmente não se mostram afectados pela (também) impug- nada intervenção do primeiro juiz até à fase da contestação. Ora, este aspeto do regime normativo impug- nado constitui uma especificidade na tramitação dos processos jurisdicionais de efectivação de responsabili- dades financeiras ao nível regional. Com efeito, nos termos do artigo 108.º, n.º 2, da LOPTC, cabe também ao juiz da secção regional territorialmente competente, que aprovou o relatório de auditoria, ordenar a citação dos demandados, para apresentarem a sua contestação, bem como ordenar a distribuição do processo pelo juiz da outra secção regional para julgamento, apresentadas as contestações ou decorrido o prazo para o efeito. No entanto, o exercício destas competências também não contende com os poderes de cognição e decisão do juiz do julgamento. Quanto ao poder de citação dos demandados para a contestação, e como analisado no acórdão do Tri- bunal de Contas, ora recorrido [cfr. passagem supra transcrita em II, B) , 14.1 – ponto 2.2.4, B) ], o regime jurídico infraconstitucional aplicável (por aplicação supletiva das regras do Código de Processo Civil, como previsto no artigo 80.º da LOPTC), pese embora confira poderes de gestão inicial do processo ao juiz que procede à citação dos demandados, traduzidos na análise preliminar do requerimento apresentado e na verificação (evidente) de exceções dilatórias insupríveis e de conhecimento oficioso (artigo 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), não faz precludir os poderes de verificação do juiz do julgamento, em fase ulterior do processo de julgamento, já que, por aplicação do n.º 5 do artigo 226.º do Código de Processo Civil, o despacho de citação não constitui caso julgado formal. Acresce que, procedendo o juiz à citação dos demandados para apresentação da contestação – dando- -lhes conhecimento de que foi proposta a ação e chamando-se os mesmos ao processo para se defenderem (artigo 219.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) –, certo é que a respetiva ponderação não cabe ao mesmo, que deve proceder à distribuição do processo, apresentadas as contestações ou findo o prazo para a sua apre- sentação. Quanto ao ato de distribuição, através do qual o juiz da secção territorialmente competente designa o juiz da secção em que o processo há de ser julgado, certo é que esse poder é exercido de forma estritamente vinculada, determinando o legislador que «o juiz da secção regional procede à distribuição do processo pelo juiz de outra secção regional» (artigo 108.º, n.º 2, da LOPTC). Cumpre apenas, a este respeito, precisar que a norma contida no n.º 3 do artigo 108.º da LOPTC, também delimitada como objeto do presente recurso pelos recorrentes, limitando-se a um aspeto meramente instrumental da distribuição – «após a distribuição devem ser remetidas fotocópias das principais peças ao juiz a quem o processo foi distribuído» –, não intro- duz qualquer questão que mereça uma ponderação autónoma da questão decorrente do número anterior da referida disposição legal. Conclui-se, assim, quanto a estas especificidades de regime decorrentes da aplicação dos n. os 2 e 3 do artigo 108.º da LOPTC, que a prolação do despacho de citação pelo juiz que aprova a auditoria, bem como a prática do ato de distribuição, também não interferem ou condicionam o juiz do julgamento, mantendo-se intocada a sua independência no ato de julgar.

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