TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

287 acórdão n.º 255/18 tem sido definida como um pressuposto processual da instauração da posterior ação para efetivação das res- ponsabilidades financeiras, cujo julgamento será já da competência da 3.ª Secção». Assim, a propositura da acção – mesmo que baseada naqueles relatórios – não cabe, em qualquer caso, ao juiz que aprova o relatório de auditoria. Serve a mesma aprovação a finalidade de delimitar a matéria de facto definida nos relatórios de auditoria, de que resulte indiciada a prática de ilícitos financeiros passíveis de responsabilização. Assim sendo, o juízo formulado é meramente indiciário. Nestes termos, a decisão (judicial) de aprovação do relatório de auditoria não tem a virtualidade de determinar o processo de forma absoluta. Isto, na medida em que cabe ao Ministério Público (e, subsidia- riamente, a outras entidades) a decisão de propor (ou não, ou não integralmente) a ação de responsabilidade financeira com base no relatório. Serve, assim, aquele ato de aprovação de pressuposto (hoje, não exclusivo) da propositura da acção, mas não torna esta obrigatória (prevendo-se no artigo 57.º, n.º 3, da LOPTC que «quando o Ministério Público declare não requerer procedimento jurisdicional, devolve o respetivo processo à entidade remetente» e no artigo 89.º, n.º 3, idem , a iniciativa subsidiária das demais entidades com legi- timidade processual ativa, no prazo de 30 dias sobre a publicação do despacho do Ministério Público que declare não requerer procedimento jurisdicional).  Deste modo, afigura-se que a decisão (judicial) de aprovação do relatório de auditoria constitui uma condição necessária, mas não suficiente, da instauração do processo por responsabilidades financeiras, seja reintegratória, seja sancionatória. 21.2. Em segundo lugar, e com maior relevância para o caso dos autos, cumpre sublinhar que a apro- vação do relatório de auditoria pelas secções (ou subsecções) do Tribunal de Contas com competências de fiscalização sucessiva ou concomitante – com base no qual pode vir a ser interposta uma acção de efetivação de responsabilidades – não consubstancia, no processo, um ato de condenação, nem assume a virtualidade de antecipar, inexoravelmente, um juízo de condenação. Com efeito, cometida a competência de julgamento a secção (regional) diversa e atenta a natureza e fina- lidades do ato de aprovação do relatório de auditoria – exprimindo um juízo meramente indiciário quanto aos ilícitos financeiros detetados e delimitando a matéria de facto respeitante aos mesmos –, não se mostra condicionado o julgamento da ação interposta com base naquele relatório. A lei confere ao julgador – juiz de secção regional diversa – os poderes de condução da audiência de julgamento, de ponderação da prova produzida e de julgamento da causa, os quais serão exercidos com a devida autonomia e independência rela- tivamente à (prévia e diversa) decisão de aprovação do relatório de auditoria, nada resultando em contrário do regime processual gizado pelo legislador, ora em apreciação. Aliás, como assinalado nas alegações do Ministério Público representado neste Tribunal [cfr. n. os 27 e 28, supra II, B) , 14.3], a distribuição de competências entre os dois juízes tem por base uma ideia semelhante – com as devidas diferenças – à que preside, em processo penal, à distinção do juiz de instrução e do juiz do julgamento, a qual constitui uma importante garantia de defesa dos arguidos (consubstanciada na estrutura acusatória do processo, princípio material do processo criminal consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da CRP). Vale, assim, quanto à matéria que nos ocupa – e também com as devidas diferenças – a reflexão feita no Acórdão n.º 482/14 (a propósito da instrução e pronúncia em processo penal): «(…) Se, no termo da instrução, o juiz de instrução entender que o processo está em condições de ser submetido a julgamento, profere despacho de pronúncia, no âmbito do qual delimita o objeto do julgamento a realizar. Na sequência deste despacho, o processo é remetido a um outro juiz que realizará o julgamento. Ora, nesse momento, «recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou inciden- tais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer» (artigo 311.º, n.º 1, do CPP). Mesmo depois de marcado o julgamento, dentro dos atos introdutórios da audiência de julgamento, o artigo 338.º, n.º 1, do CPP, ainda permite que o tribunal conheça e decida «das nulidades e de quaisquer outras questões

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