TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
285 acórdão n.º 255/18 «(…) O artigo 203.º da Constituição dispõe que os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei. Sendo independentes em relação aos demais poderes do Estado, os tribunais também são independentes entre si, salvo as relações de hierarquia ou supra ordenação dentro de cada categoria de tribunais (artigos 210.º, 212.º e 221.º da CRP). (…) A independência dos tribunais materializa-se ou afere-se substancialmente pela independência dos respectivos juízes. Na vertente que pode ser relevante, traduz-se no dever de julgar apenas segundo a Constituição e a lei, sem sujeição a quaisquer ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso pelos tribunais superiores. Como dizem G. Canotilho e V. Moreira, Constituição da República Portuguesa Ano- tada, Vol. II, 4.ª ed., Coimbra, 2010, pág. 514, a independência dos tribunais e respectivos juízes “convoca várias dimensões densificadoras da liberdade à independência no julgar: (i) liberdade contra injunções ou instruções de quaisquer autoridades; (ii) liberdade de decisão perante coações ou pressões destinadas a influenciar a actividade de jurisdictio ; (iii) liberdade de acção perante condicionamento incidente sob a actuação processual; (iv) liberdade de responsabilidade, pois só ao juiz cabe extrinsecar o direito a obter a solução justa do feito submetido à sua apreciação”.» 19.2. Assim, se a independência dos tribunais responde, primeiramente, à estruturação e organização do poder, moldada sobre a separação de poderes – que assim também se assegura –, tenha-se presente constituir a independência dos juízes uma característica indispensável do ato de julgar e, portanto, da própria função judicial, não compaginável com qualquer forma de coação ou condicionamento do juiz responsável pela decisão da causa. Numa vertente como noutra, o princípio responde às exigências de realização do Estado de direito democrático, constitucionalmente consagrado no artigo 2.º da Constituição. Além do mais, assegurar a necessária independência e imparcialidade dos juízes no exercício das funções que lhes são cometidas constitui uma importante garantia de justiça, pois esta apenas pode ser alcançada por via de um julgamento imparcial das causas submetidas ao tribunal (assim correspondendo à confiança dos cidadãos e da comunidade no poder judicial). Nesta perspetiva, o julgamento imparcial é também uma relevante dimensão das garantias de defesa, mormente em processos penais e sancionatórios, servindo os pro- pósitos de atingir a justiça e a verdade na decisão e procurar a correção do resultado do exercício da função de julgar segundo a Constituição e a lei. Assim, no Acórdão n.º 167/07: «(…) 9. O Tribunal Constitucional já por diversas vezes se debruçou sobre a questão da independência e da impar- cialidade do julgador, nomeadamente no âmbito do Processo Penal. Recorrendo, por exemplo, ao seu Acórdão n.º 124/90 ( Diário da República , II Série, de 8 de fevereiro de 1991), verificamos que sempre o Tribunal Constitucional observou que “num Estado de direito, a solução jurídica dos conflitos há de, com efeito, fazer-se sempre com observância de regras de independência e de imparcialidade, pois tal é uma exigência do próprio direito de acesso aos tribunais, que a Constituição consagra no artigo 20.º, n.º 1 (cfr., neste sentido, o Acórdão n.º 86/88 deste Tribunal, publicado no Diário da República , II Série, de 22 de agosto de 1988). A garantia de um julgamento independente e imparcial é, de resto, também uma dimensão – e dimensão importante – do princípio das garantias de defesa, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, para o pro- cesso criminal, pois este tem que ser sempre a due process of law. Para que haja um julgamento independente e imparcial, necessário é que o juiz que a ele proceda possa julgar com independência e imparcialidade. (…) não pode, porém, esquecer-se a necessidade de existir um quadro legal que «promova» e facilite aquela «independência vocacional». Assim, necessário é, inter alia , que o desempenho do cargo de juiz seja rodeado de cautelas legais destinadas a garantir a sua imparcialidade e a assegurar a confiança geral na objectividade da jurisdição.
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