TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
239 acórdão n.º 253/18 importante garantir o papel uniformizador do STJ e permitir a sua intervenção, nomeadamente na situação de decisões contraditórias do tribunal de segunda instância sobre a mesma questão fundamental de direito; F. Tal significa que deve ser irrelevante, para admissibilidade do recurso de revista ao abrigo desta alínea d) , o valor da causa e da sucumbência porque a irrecorribilidade tem a ver com razões de política legislativa quanto a certos processos ou certas decisões, como é caso do art. 370.º n.º 2 do CPC quanto às providências cautelares ou, em particular, no presente caso, o n.º 5 do artigo 66.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18-9, alterado pelas Leis n.º 13/2002, de 19-02, e n.º 4-A/2003, de 19-02, (CE/99), que esti- pula “[s]em prejuízo dos casos em que é sempre admissível recurso, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do tribunal da Relação que fixa o valor da indemnização devida”. G. Ou seja, do Acórdão da Relação que fixe uma indemnização no âmbito de um processo de expropriação por utilidade pública não caberá, em regra, recurso de revista para o STJ, quer a indemnização fixada seja de 1 000 000 € ou de 1 € , a não ser que a situação se enquadre numa das exceções previstas no n.º 2 do art. 629.º do CPC; H. As exceções previstas no n.º 2 do art. 629.º do CPC dizem respeito a situações em que o legislador entendeu que, quer pela relevância das matérias envolvidas, quer pelos efeitos que visam prosseguir, fazia sentido afastar o filtro do valor e da sucumbência, relegando para segundo plano o objetivo de descongestionar os tribunais superiores e de assegurar que só sejam submetidas à apreciação do STJ as questões mais merecedoras de análise e admitir sempre recurso, ainda que o valor do processo e/ou da sucumbência não atingissem as proporções fixadas na lei para esse efeito; I. Estando em causa interesses que dizem respeito à certeza do direito que é assegurada pela uniformização juris- prudencial, as razões que motivaram o legislador a prevenir a recorribilidade ilimitada sobrepõem-se àquelas que levaram o legislador a restringir o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, o que se verifica tanto na situação prevista na al. c) como na d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC, não se vislumbrando quaisquer motivos para o intérprete, maxime o julgador, distinguir uma situação da outra. J. Pelo contrário; essa distinção – i. e. de permitir recurso para o STJ, independentemente do valor e da sucum- bência, do Acórdão da Relação proferido contra jurisprudência uniformizada do STJ, mas exigir que o valor da ação seja superior à da alçada da Relação para admitir recurso de revista do Acórdão da Relação, que esteja em contradição com outro dessa ou doutra Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito – sempre seria violadora do princípio constitucional da igualdade, na medida em que, estando tipificadas na lei quatro situações em que as decisões dos tribunais são recorríveis “independentemente do valor da causa e da sucum- bência”, não poderá excluir-se, por vontade judicial discricionária com base numa interpretação ab-rogante e inconstitucional, um desses grupos, a pretexto do sentido da expressão “irrecorribilidade por motivo estranho à alçada do tribunal”, como se esta fosse equívoca; K. A expressão “por motivo estranho à alçada do Tribunal” tem o mesmo significado desde 1961 e é alheia à exi- gência de que o recurso dependa do valor do processo em relação à alçada; L. Em parte alguma desta norma do artigo 629.º, n.º 2, alínea d) , do CPC consta o requisito complementar de que o valor da ação e a sucumbência admitam esse recurso, o que é incompatível com expressão adverbial “sempre”, que não acolhe outra interpretação que não seja a da prevalência destas exceções sobre o regime mais restritivo do n.º 1 do art. 629.º ou dos arts. 671.º e 672.º do CPC. M. O intérprete maxime o julgador não pode corrigir o legislador, quando este quis admitir sempre a recorribili- dade para o Supremo Tribunal de Justiça em situações em que, à partida, não havia recurso “normal”, como no caso em apreço, em que a norma do art. 66.º n.º 5 do Código das Expropriações o impede, seja qual for o valor da indemnização fixada. Por isso, o legislador inseriu a frase inicial “independentemente do valor da causa e da sucumbência”; N. O art. 9.º n.º 3 do Código Civil estipula que o intérprete presumirá que o legislador “soube exprimir o seu pen- samento em termos adequados”, o que implica que só quando razões ponderosas, baseadas noutros subsídios interpretativos, conduzam à conclusão de que não é o sentido mais natural e direto da letra da lei que deve ser
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