TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
224 C) O artigo 4.º do RJAT (Decreto-Lei n.º 10/2011), ao permitir que Portaria, no caso a Portaria n.º 112- A/2011, modifique o âmbito material de aplicação da arbitragem tributária por si (RJAT) delimitado (nos seus artigos 2.º e 10.º), viola a Lei habilitante, e viola o artigo 112.º, n.º 2 e n.º 5, da Constituição. D) Atenta a sua antinomia quer com o âmbito material de aplicação da arbitragem tributária estabelecido no RJAT, quer com o âmbito projetado na Lei de Autorização Legislativa (deve [a arbitragem tributária] cons- tituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial)], o artigo 2.º, designadamente na sua alínea a) , da Portaria n.º 112-A/2011, deve ser interpretado de modo a fazer o menor dano possível a estas prescrições de nível hierárquico superior e seus prescritos objetivos. E) A redação introduzida pela Lei n.º 64-B/2011 ao artigo 4.º do RJAT, no sentido de que a Portaria de vincula- ção “estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos”, não pode ser interpretada como conferindo, através do uso da expressão designadamente, um cheque em branco para a Portaria em causa fazer o que quiser da delimitação material do âmbito da arbitragem consagrado nos atos normativos hierarquicamente superiores, designadamente no RJAT, artigos 2.º, n.º 1, e 10.º, n.º 1. Pois isso viola o artigo 112.º, n.º 5, da Constituição. F) Donde que, por mais esta razão, no máximo dos máximos a chamada Portaria de vinculação poderá modificar o âmbito aplicável da arbitragem tributária por referência ao tipo de litígio ou ao seu valor, não também por referência ao facto de o litígio ter sido precedido de procedimento de reclamação graciosa ou, pelo contrário, de procedimento de revisão oficiosa [com afastamento, neste último caso, da arbitragem tributária pela Por- taria, na interpretação da alínea a) do seu artigo 2.º pretendida pela AT], ou por referência a quaisquer outros factos que, por capricho ou outro motivo, a Portaria resolvesse eleger. Por cautela de patrocínio, sem conceder: G) A norma na alínea a) do artigo 2.º da Portaria de vinculação nenhuma inovação pretendeu consagrar. Limita- -se a acolher a solução praticada em sede de processo judicial tributário/impugnação judicial, vertida no artigo 131.º do CPPT, através de expressa remissão para aí: sempre que se esteja perante uma autoliquidação, antes de ir para tribunal, tem de se dar oportunidade à AT para apreciar essa autoliquidação e ilegalidades que lhe sejam apontadas. H) Este objetivo (de apreciação prévia pela AT) é aliás textualmente assumido na alínea a) do artigo 2.º da Por- taria de vinculação: não se pode recorrer a Tribunal Arbitral com respeito a pretensões contra autoliquidações “que não tenham sido precedidas de recurso à via administrativa”. I) O facto de o artigo 131.º do CPPT dizer que no caso da autoliquidação a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa, jamais, em décadas de aplicação desta norma, levou os Tribunais tributários a entenderem ser de excluir a apreciação de impugnações de autoliquidações precedidas de procedimento administrativo de revisão oficiosa. E a AT aceita pacificamente esta interpretação deste quadro legal para o qual remete a Portaria de vinculação (ver citado ponto 28. das alegações da AT). J) Aceita, pois, a AT e toda a comunidade jurídica que lida com esta norma, o entendimento equilibrado dos Tribunais tributários de que o objetivo perseguido por esta norma é, quando se está perante autoliquidações, dar oportunidade à AT para se pronunciar previamente à impugnação judicial. K) Donde que, para efeito da satisfação deste, e único, objetivo da norma, seja indiferente (espírito da norma) se essa pronúncia prévia da AT se dá em sede de procedimento administrativo de revisão oficiosa ou de pro- cedimento administrativo de reclamação graciosa stricto sensu . L) Sendo este o entendimento, velho de anos, em sede de impugnação judicial, e sendo este entendimento de há muito respeitado pela AT, não se percebe por que razão defende a AT o contrário em sede do meio alternativo da impugnação (substituto desta) que é a arbitragem tributária. M) A arbitragem tributária é do tipo institucional. É um substituto, organizado e permanentemente disponível, do recurso aos tribunais tributários. É, pois, um regime legal de resolução alternativa de conflitos no campo dos impostos, paralelo ao processo judicial tributário. E como regime legal que é está sujeito às mesmíssimas regras interpretativas a que estão sujeitas todas as leis e normas jurídicas.
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