TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
176 6.ª Não obstante, se a existência do Supremo Tribunal de Justiça tem consagração constitucional, no artigo 210.º da Constituição, os contornos exatos das suas atribuições não têm tal consagração. 7.ª A resposta a questões de harmonização de vários valores constitucionais em presença busca-se, em regra, através da sua concordância prática. Não obstante, há que referir que o direito ao recurso em processo penal tem, por um lado, uma dignidade supraconstitucional, que lhe advém da sua consagração no artigo 8.º da Declaração Univer- sal dos Direitos do Homem (DUDH) e também no artigo 13.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH). E por outro lado tem o valor e a função de verificação da efetividade da vigência dos outros direitos liberdades e garantias em presença, maxime da verificação da efetiva observância do due process of law , com as cons- titucionais garantias de defesa, e da efetiva observância da vigência dos princípios da legalidade e da tipicidade em Direito Penal substantivo. 8.ª Há portanto uma primazia hierárquica, axiológico-funcional, do princípio do duplo grau de jurisdição de que não se pode fugir e que implica que (contra todas as correntes demagógicas defensoras de justicialismos instantâ- neos), antes de se ceder às necessidades de concordâncias práticas, há que enfatizar a importância da existência de um efetivo direito ao recurso (ou, o que é o mesmo, a importância de um efetivo duplo grau de jurisdição) relativa- mente às decisões condenatórias assentes em teses desfavoráveis ao arguido de que ele não se tenha antes defendido. É que sem um efetivo direito ao recurso (incluindo o fundamental recurso concreto de inconstitucionalidade), os demais valores e princípios constitucionais em matéria Penal e Processual Penal não passarão de palavras vãs, pois na prática cederão perante as mais inconcebíveis e variadas erradas aplicações concretas do Direito, que, sem escrutínio e sem possibilidade de alteração, prevaleceriam sempre sobranceiramente. 9.ª Muito importante no plano constitucional é também, como adiante se verá, a fundamentação das decisões judiciais, como marca do Estado de Direito contemporâneo. 10.ª A concreta interpretação normativa que constitui objeto do presente recurso ainda não foi apreciada pelo Tri- bunal Constitucional, não obstante a norma do art. 400.º, n.º 1, al. f ) , do CPP, noutras dimensões interpretativas, já ter sido por diversas vezes julgada não inconstitucional por este Alto Tribunal (mas nunca no que concerne à específica interpretação normativa em causa no presente recurso). 11.ª Na decisão recorrida não foi feito um juízo de não essencialidade da alteração da fundamentação operada pela Relação; devia sim ter sido feito (como chegou a estar feito) um juízo de essencialidade dessa alteração da funda- mentação. 12.ª O que se sustenta neste recurso é que o que o art. 32.º, n.º 1 (e também o art. 205.º, n.º 1), da Constituição impõe é uma interpretação normativa do art. 400.º, n.º 1, al. f ) , do CPP que implique que, em todos os casos de decisões das Relações confirmativas das condenações da 1.ª instância – o que inclui os casos das alterações in mellius – tenha que ser apurado se houve ou não uma fundamentação essencialmente diferente por parte da Relação, para, em caso afirmativo, se considerar haver recorribilidade para o STJ e, em caso negativo, não.
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