TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

156 «As bases do regime e âmbito da função pública “começam logo por integrar a definição do regime jurídico da Função Pública e as circunstâncias em que o mesmo pode eventualmente ser substituído por outra normação. Depois, as bases compreenderão igualmente a disciplina fundamental de todas as matérias cuja regulamentação a Constituição remeta para a lei, nomeadamente o regime de acumulação de funções, o sistema de incompati- bilidades, o direito de regresso sobre os funcionários e agentes. Por fim, assumirá a natureza de base do regime a tipicização das formas de constituição, modificação ou extinção da relação de emprego público, o sistema de carreiras ou categorias da Função Pública, as condições gerais para ingressar e aceder aos lugares superiores, os direitos reconhecidos e os deveres impostos, o sistema retributivo e as suas componentes, o regime sancionatório, as garantias jurídicas e os meios de resolução de conflitos” (vide Paulo Veiga e Moura, A Privatização da Função Pública , Coimbra Editora, Coimbra, 2004, p. 101); “O regime e âmbito da função pública constituem reserva de competência legislativa parlamentar desde a versão originária da Constituição, circunscrita, desde a primeira revisão, às respetivas bases. De acordo com a leitura da Comissão Constitucional, à intervenção parlamentar cabia a definição dos aspetos ou elementos identificativos do regime da função pública, daquilo que era «comum e geral a todos os funcionários e agentes, o que, nestes termos, era menos do que a «reserva integral das volições primárias» do regime. As bases cons- tituem os princípios, as opções político-legislativas essenciais, a «regulamentação de princípio» das respetivas relações de trabalho […] (vide Ana Fernanda Neves, O Direito da Função Pública, cit. , pp. 386-387). A alínea t) “reserva à AR a matéria das «bases» do regime e âmbito da função pública (ou seja, o estatuto próprio da função pública como organização e como relação jurídica de emprego específica), bem como a delimitação do seu âmbito (ou seja, a demarcação das áreas em que os organismos e os servidores do Estado estão sujeitos àquele regime). Esta delimitação nem sempre é fácil […], mas deve interpretar-se no sentido da extensão da reserva da AR, sobretudo quando estiverem em causa, direta ou indiretamente, direitos fundamentais (acesso à função pública e cargos públicos, direito de exercício de profissão), […]. (vide Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, II anot. XX ao artigo 165.º, p. 333)». Importa também precisar que o regime da função pública se estende ao contrato de trabalho em fun- ções públicas, pois a teleologia intrínseca da reserva de lei da Assembleia da República, baseada no estatuto próprio da função pública, mantém-se no contexto do contrato de trabalho individual nas pessoas coletivas públicas. O conceito relevante de função pública, a que se refere o artigo 165.º, n.º 1, alínea t) , da CRP, conforme têm entendido a jurisprudência do Tribunal Constitucional (cfr. Acórdão n.º 793/13, seguindo o Acórdão n.º 468/10) e a doutrina, não é o conceito restrito – que abrangeria apenas os trabalhadores da Administração Pública cujas relações de emprego fossem disciplinadas por um específico regime jurídico de direito administrativo, de natureza estatutária – mas o conceito amplo que abarca todas as relações de emprego estabelecidas com pessoas coletivas integradas na Administração Pública (ou com um ente público). Deste modo, o conceito constitucional de «base do regime da função pública» é, assim, um conceito aberto a conteúdos diversos, caracterizados pela sua importância para a estruturação do regime jurídico das relações de emprego público (Acórdão n.º 793/13). A interpretação atualista da reserva relativa de compe- tência legislativa da Assembleia da República em matéria de “bases do regime e âmbito da função pública” [artigo 165.º, n.º 1, alínea t) , da Constituição], reporta-se, assim, à relação jurídica de emprego público, independentemente desta última se constituir, ao abrigo da legislação ordinária, por nomeação ou por con- trato de trabalho em funções públicas. Em face destas regras de distribuição de competências, não podem as Assembleias Legislativas das regiões autónomas aprovar atos legislativos, seja no exercício da sua competência legislativa primária, seja no exercício da sua competência legislativa complementar, que tenham por objeto a modificação ou a definição de opções político-legislativas correspondentes a bases integradas na reserva de competência legislativa da Assembleia da República.

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