TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

140 ao condicionarem a concessão de licença para o exercício da atividade de segurança privada ao requisito da inexistência de condenação, por sentença transitada em julgado, pela prática de crime doloso, são normas que, por si, restringem a liberdade de escolha e de exercício da atividade de segurança privada enquanto ati- vidade profissional, cabendo a este Tribunal aferir da legitimidade dessa restrição à luz do regime constante do artigo 18.º da Constituição. É o que se fará de seguida. 15. Plasmado no n.º 1 do artigo 47.º, o direito fundamental à liberdade de escolha de profissão assegura que todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho que pretendam executar, salvo as restrições legais impostas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua própria capacidade. Densificando, o direito fundamental à liberdade de escolha de profissão implica, no essencial, que o seu titular não possa ser forçado a escolher (e exercer) uma profissão, e, com superior relevo para os presentes autos, que o seu titular não possa ser impedido de escolher (e exercer) livremente uma determinada profissão (sobre o direito fundamental à liberdade de escolha de profissão, cfr., entre outros, os Acórdãos n. os  474/89, 187/01, 563/03, 154/04, 3/11, 362/11, 88/12, 89/12, 96/13 e 509/15, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) .  Esta última vertente, relativa à liberdade para escolher qualquer profissão que não seja proibida por lei, baseia-se no reconhecimento de que a realização de cada pessoa, e da sua dignidade, também passa pela escolha e exercício de actividade profissional, de qualquer género, seja típico ou atípico, permanente tempo- rário ou sazonal, subordinado ou independente, em exclusividade ou em cumulação. Em suma, encontra-se constitucionalmente protegido o direito a escolher livremente, sem impedimentos, nem discriminações, qualquer profissão. De todo o modo, à semelhança dos restantes direitos fundamentais, o direito à liberdade de escolha e exercício de profissão não é um direito absoluto, sendo que no próprio enunciado normativo relativo à sua consagração encontra-se habilitação constitucional expressa à imposição de restrições legais (parte final do n.º 1 do artigo 47.º).  Assim sendo, a exigência de fundamento constitucional à restrição de um direito fundamental (primeira parte do n.º 2 do artigo 18.º), é, no presente caso, verificável com meridiana clareza e sem necessidade de se entrar na discussão sobre a admissibilidade de restrições a direitos fundamentais não expressamente autori- zadas pela Constituição: consta do n.º 1 do artigo 47.º habilitação expressa à determinação, por via legal, de restrições ao direito fundamental à liberdade de escolha de profissão. Não é, por isso, discutível se a Constituição admite a adoção de medidas legais restritivas deste direito fundamental, desde que fundadas na capacidade do titular do direito fundamental ou sejam impostas pelo interesse colectivo (segunda parte do n.º 1 do artigo 47.º). Ora, as normas legais aqui em escrutínio, relativas à verificação do requisito negativo de não condena- ção, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime na forma dolosa, não encontram o seu fundamento na garantia da aptidão, técnica ou física, para o exercício da atividade profissional, mas sim na necessidade de assegurar a idoneidade pessoal de quem possa exercer a atividade de segurança privada, enquanto atividade de reconhecido interesse público. Com efeito, sendo a atividade de segurança privada um modo organizado e profissional de administrar a autototela – que, nos termos gerais, é uma atividade difusa, casuística e, inorgânica que não prossegue qual- quer escopro locrativo –, não pode deixar de se reconhecer ao Estado o dever de prevenir os excessos e riscos, associados a tal atividade, em especial o uso excessivo ou abusivo de formas de coação privada. Para o efeito, o comportamento anterior, perante os bens que estão em causa no exercício da segurança privada – respeito pela vida e integridade física das pessoas, respeito pela ordem e tranquilidade públicas, respeito pela reserva da intimidade da vida privada e, em geral, pelos direitos e liberdades de terceiros e pelo respetivo património – não deve ser pura e simplesmente desconsiderado. Em abstrato não existem dúvidas de que o requisito previsto nas normas legais aqui em crise encontra a sua finalidade na consideração de que a proteção do interesse coletivo não se coaduna com o exercício de

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