TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
132 interposição de um exame administrativo capaz e avaliar cuidadosamente a gravidade do facto praticado e a ido- neidade cívica de cada candidato que almeja exercer a atividade de segurança privada, bem como os aspetos que se prendem com as perspetivas de ressocialização do agente. 16.º Somente após esta ponderação será possível decidir sobre a virtualidade da condenação para fundamentar a recusa de concessão da licença requerida. 17.º Ao impedir, em termos gerais e abstratos, sem qualquer mediação ponderadora através de uma condenação judicial ou decisão administrativa concreta, o exercício da atividade de segurança privada por quem foi definitiva- mente condenado pela prática de crime doloso, a alínea d) , do n.º 1, e, por remissão, os n. os 2, 3 e 4 do artigo 22.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, estão em clara rota de colisão com os supracitados dispositivos constitucionais. 18.º É interessante sublinhar, uma vez mais, que a este respeito nem sequer se coloca um verdadeiro problema de balanceamento de direitos fundamentais a ser resolvido, no plano legislativo, segundo critérios de proporcionali- dade. 19.º Por maior força que pudéssemos emprestar ao argumento sobre a verificação de interesse público relevante a favor de uma fixação legal de efeitos necessários ou automáticos das penas, existe a montante uma proibição cate- górica imune a todo e qualquer tipo de consideração utilitarista de custo-benefício. O texto constitucional é, aliás, bastante enfático neste sentido (n.º 4 do artigo 30.º): «nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos. 20.º Nesta direção vai também a jurisprudência firme e constante do Tribunal Constitucional, ao considerar que aqueles efeitos materialmente equivalem, na prática, a uma outra pena, que, por isso mesmo, deve estar sujeita às regras próprias do Estado de direito democrático, designadamente o princípio da reserva judicial, o princípio da culpa e o princípio da proporcionalidade da sanção. Basta mencionar, por exemplo, os Acórdãos n. os 154/04, 239/08, 368/08 e 25/11. 21.º Por sua clareza e relevância, merece transcrição um fragmento do mencionado Acórdão n.º 25/11: «O artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, estabelece que «[N]enhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos». Como já se escreveu no Acórdão n.º 368/08, esta norma constitucional «visa salvaguardar que qualquer sanção penalizadora da conduta punida, independentemente da sua natureza e medida, resulte da concreta apreciação, pela instância decisória, do desvalor dessa conduta, por confronto com os padrões normativos apli- cáveis. O que se proíbe é a automática imposição de uma sanção, como efeito mecanicisticamente associado à pena ou por esta produzido, sem a mediação de qualquer juízo, em concreto, de ponderação e valoração da sua justificação e adequação, tendo em conta o contexto do caso. E a proibição é necessária para garantia de efetivação de princípios fundamentais de política criminal (…)». Ou seja, como se sustentou no Acórdão n.º 284/89: «(…) com tal preceito constitucional pretendeu-se proibir que, em resultado de quaisquer con- denações penais, se produzissem automaticamente, pura e simplesmente ope legis , efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos e pretendeu-se que assim fosse porque, em qualquer caso, essa
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