TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

118 sentido que o enunciado legal previsse um terceiro grupo de situações, em alternativa às duas outras anterior- mente previstas, para se concluir que não se chega, afinal, a ultrapassar o âmbito da “utilização de um bem do domínio público”, pois só conta a remoção que a ela conduza. […] Esta noção mais ampla de taxa não representa, aliás, uma inovação, por via legislativa, pois o legislador limitou-se a perfilhar uma orientação, contraposta à acima referida, já anteriormente presente num significa- tivo setor da doutrina portuguesa. Na verdade, a classificação tripartida, sem qualquer restrição, das modalida- des de taxas já era advogada por autores como Alberto Xavier, Manual de direito fiscal, I, Lisboa, 1974, 42-43 e 48-53 Braz Teixeira, Princípios de direito fiscal, I, Coimbra, 1985, 43, e Sousa Franco, Finanças públicas e direito financeiro, II, 4.ª ed., 1992, 64”. […]’. 2.5.2. As circunstâncias, já assinaladas (itens 2.2.1. e 2.4., supra ), de a TMPC englobar indiferenciadamente todos os custos do serviço municipal de proteção civil e de a previsão da referida taxa no RGTAL ser genérica são de molde a suscitar dúvidas muito consistentes quanto à necessária bilateralidade ou sinalagmaticidade deste tributo, ainda que se adote o conceito mais amplo de taxa que se traçou no Acórdão n.º 177/10. Dúvidas que, de resto, não têm escapado à atenção da doutrina. Com efeito, em comentário ao artigo 6.º RGTAL, refere Sérgio Vasques ( Regime das Taxas Locais: Introdução e Comentário, Coimbra, 2008, pp. 109 e segs.): ‘[…] A primeira perplexidade que a leitura do artigo 6.º nos suscita está no apelo que legislador faz à noção económica das ‘utilidades’, empregando-a aí onde a ciência jurídico-tributária se costuma referir antes a pres- tações. Com efeito, é pacífica entre a doutrina a ideia de que as taxas constituem tributos comutativos que se dirigem ao financiamento de prestações públicas determinadas, mal se compreendendo a razão pela qual o legislador nos vem dizer neste artigo 6.º que as taxas locais incidem sobre as utilidades prestadas aos particulares ou geradas pela atividade dos municípios e freguesias, como no artigo 5.º nos diz já que as taxas locais podem visar o financiamento de ‘utilidades geradas pela realização de despesa pública’. O recurso à noção económica das ‘utilidades’ mostra-se neste contexto de alcance impreciso, parecendo sugerir-se que a base objetiva de inci- dência das taxas locais está além das concretas prestações que a administração local dirige ao contribuinte, seja na forma da utilização de bens, seja na forma da prestação de serviços. […] A segunda perplexidade que a leitura do artigo 6.º nos traz está na sugestão de que as autarquias locais possam criar taxas que não incidem sobre prestações públicas concretas, de que o sujeito passivo seja o efetivo causador ou beneficiário. Essa sugestão, que encontramos já presente no n.º 2 do artigo 5.º, remetendo de modo oblíquo para as contribuições especiais de melhoria, vemo-la retomada no n.º 2 do artigo 6.º, remetendo agora para a tributação ambiental, assim como nas referências muito incertas […] a ‘prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da proteção civil’ […]. Como sublinhámos […], a qualificação de um tributo local como taxa exige por princípio que este incida sobre prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo e não apenas sobre prestações de que o sujeito passivo seja o presumível causador ou bene- ficiário. Sempre que um tributo local assente sobre prestações presumidas com um grau de força relativo, em termos tais que o aproveitamento da prestação pública não se possa dizer certo, mas apenas provável, estaremos perante contribuições cuja criação está vedada às autarquias locais em virtude da reserva de lei parlamentar constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição da República. […] Precisamente porque os tributos ambientais tomam prototipicamente a forma de contribuições, a meio caminho entre as taxas e os impostos, é preocupante a sugestão que o legislador faz no artigo 6.º, n.º 2, convi- dando as autarquias locais à criação de taxas ambientais que se expõem facilmente à invalidação por inconsti- tucionalidade orgânica. Problema semelhante, se não mais grave ainda, suscitam as referências deste artigo às

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