TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

92 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL equiparada à licença de maternidade ou à licença por adoção a uma trabalhadora que sofre da incapacidade de levar uma gravidez a termo e que recorreu a um contrato de maternidade de substituição» (itálico aditado). Sendo a dignidade do ser humano consagrada como parâmetro fundamental do direito da União Euro- peia no artigo 1.º da CDFUE, não deixa de ser significativo que o Tribunal de Justiça se limite a afastar o reconhecimento dos invocados direitos sociais pelas Diretivas em análise apenas com base na letra, no sistema e na teleologia dessas mesmas Diretivas, não questionando a admissibilidade de princípio, face a opção político-jurídica nelas vertida, de tais direitos poderem ser reconhecidos aos beneficiários de acordos de gestação de substituição. B.3. A gestação de substituição no direito comparado 13. A gestação de substituição também tem sido objeto de amplo debate interno em muitos Estados. Em boa parte dos países, existe um vazio de regulação relativamente aos procedimentos de gestação de subs- tituição: não se proíbe, mas também não se reconhece legalmente a validade e a eficácia dos contratos de gestação de substituição ou as consequências deles decorrentes. No âmbito de tais ordenamentos, ocorrendo a celebração de contratos de gestação, os beneficiários procuram “validar” as consequências deles decorrentes, por via do recurso ao instituto da adoção. As soluções legislativas encontradas aí onde existe um regime legal expresso podem dividir-se em três grupos fundamentais. Alguns ordenamentos jurídicos permitem e regulam a prática, a título oneroso e, ou, gratuito, estabelecendo vínculos de parentalidade entre os beneficiários e a criança concebida imediatamente após o parto, de forma direta e automática, por força da lei. Noutros ordenamentos, contudo, verifica-se um reconhecimento inicial da gestante como mãe, sendo necessário um processo judicial para atribuição da maternidade e paternidade aos membros do casal beneficiário. Um último grupo de países proíbe e pune a prática da gestação de substituição. A proibição é, aliás, a solução típica dos ordenamentos jurídicos romano-germânicos. Efetivamente, essa é a regra constante das ordens jurídicas da Alemanha, da Áustria, de Espanha, de França e de Itália. Na Suíça, tal proibição encontra-se estabelecida logo ao nível da Constituição, juntamente com a doação de embriões [cfr. o artigo 119.º, alínea 2, letra d) , da Constitution fédérale de la Confédération suisse ]. Ainda no âmbito da União Europeia, há outros Estados-Membros que proíbem expressamente a gestação de substituição, como é o caso da Bulgária e de Malta. A matéria tem sido bastante debatida nos países nórdicos, tendo a Noruega clarificado as regras de reconhecimento da paternidade das crianças nascidas através de gestação de substi- tuição no estrangeiro, embora a prática não seja legal no país. Também não o é na Dinamarca, na Finlândia (onde decorreu sem enquadramento legislativo até 2007, altura em que foi proibida), nem na Suécia (onde um relatório independente solicitado pelo governo, em 2016, concluiu pela necessidade de proibição, em virtude do risco de pressões para a gestante e da falta de conhecimento das consequências da prática para as crianças nascidas através da mesma). Uma proibição expressa vigora também em quatro Estados federados dos Estados Unidos da América: Indiana, Michigan, Nova Jérsia e Nova Iorque. É ainda importante notar que um grupo relevante de países com legislação mais permissiva nesta maté- ria tem vindo a adotar restrições importantes. Nesse sentido, alguns Estados passaram a proibir os contratos onerosos de gestação de substituição (por exemplo, a Tailândia, em 2015, e a Índia, em 2016). Foram igual- mente introduzidas limitações ao universo subjetivo dos beneficiários possíveis da gestação de substituição, em particular restringindo-se o acesso a nacionais e, ou, estrangeiros legalmente residentes no país (é, por exemplo, o caso, desde 2015, do Nepal e da Índia; a Tailândia, também em 2015, limitou a sua prática gratuita aos casais heterossexuais casados, devendo pelo menos um dos seus membros ter nacionalidade tailandesa). Desta forma, muitos dos países que constituíam elementos chave do mercado internacional de gestação de substituição têm vindo a limitar a prática, reduzindo, assim, as possibilidades de recurso a tais mecanismos por parte dos cidadãos de outros países.

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