TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

814 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a conformação estatutária interna, tão só com o limite genericamente assinalado em matéria de direitos dos filiados – assim o artigo 17.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 595/74, de 7 de novembro, dispunha que «os estatu- tos devem conferir aos filiados meios de garantia dos seus direitos, nomeadamente através da possibilidade de reclamação ou recurso para os órgãos internos competentes.». Assim sendo, compreende-se aberto um (mais ou menos vasto) campo de aplicação do n.º 7 do artigo 103.º-C da LTC em face do possível silêncio dos estatutos partidários quanto aos meios internos e próprios de fiscalização dos atos eleitorais ocorridos no seio do partido. Contudo, o quadro jurídico-legal dos partidos políticos viria a sofrer grandes alterações por via da publicação da atual Lei dos Partidos Políticos. Com efeito, e para o que aqui interessa, a Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto, com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 2/2008, de 14 de maio (Lei dos Partidos Políticos) veio estabelecer – em termos devidos – uma estrutura organizatória (mínima) dos partidos políticos, com expressa previsão da constituição de um órgão jurisdicionalizado com competências de controlo da legalidade interna do partido. Assim, a lei previu a obrigatoriedade de criação de um órgão de jurisdição [artigo 24.º, alínea c) , da Lei dos Partidos Políticos], órgão que regulou no seu artigo 27.º (os membros do órgão de jurisdição democratica- mente eleito gozam de garantia de independência e dever de imparcialidade, não podendo, durante o período do seu mandato, ser titulares de órgãos de direção política ou mesa de assembleia), estabelecendo, do mesmo passo, garantias jurisdicionais de fiscalização da legalidade e regularidade dos atos internos dos partidos, incluindo as eleições dos titulares dos respectivos órgãos, numa maior articulação com o regime legal vigente de impugnação das deliberações de órgãos partidários e das eleições de titulares de órgãos partidários contido nos artigos 103.º-C e 103.º-D da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional. Com efeito, se as garantias em matéria disciplinar se encontram reguladas no artigo 22.º da Lei dos Partidos Políticos, o seu artigo 30.º dirige-se às demais deliberações internas do partido ao estabelecer que «As deliberações de qualquer órgão partidário são impugnáveis com funda- mento em infração de normas estatutárias ou de normas legais, perante o órgão de jurisdição competente» (n.º 1) «Da decisão do órgão de jurisdição pode o filiado lesado e qualquer outro órgão do partido recorrer judicialmente, nos termos da lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional» (n.º 2) Já em matéria de procedimentos eleitorais, garante o artigo 34.º que as eleições partidárias devem observar a regra da apreciação jurisdicionalizada da regularidade e da validade dos atos de procedimento eleitoral [artigo 34.º, n.º 1, alínea c) ], que os atos de procedimento eleitoral são impugnáveis perante o órgão de jurisdição próprio por qualquer filiado que seja eleitor ou candidato (artigo 34.º, n.º 2) e, ainda, que das decisões definitivas proferidas ao abrigo do dis- posto no número anterior cabe recurso para o Tribunal Constitucional (artigo 34.º, n.º 3). Assim, da Lei dos Partidos Políticos vigente resulta reforçada a ideia de que o recurso judicial perante o Tribunal Constitucional só é admissível se houver impugnação prévia das eleições partidárias perante o órgão de jurisdição competente. Por outro lado, quando o legislador de 2003 prevê, como obrigatória, a criação de um órgão de jurisdição e estabelece garantias de sindicabilidade interna das eleições dos titulares de órgãos de partidos políticos, confere uma resposta diferenciada às situações em que esses órgãs e esses meios internos não se encontrem porventura previstos nos estatutos internos do partido, o que não deixa de ter significativas consequências na necessidade de recurso à norma contida no n.º 7 do artigo 103.º-C da LTC, pois se trata de norma que também visava obviar às mesmas situações (num quadro legal que permitia que ocorressem). Ora, entendendo-se o limitado escopo da norma contida no n.º 7 do artigo 103.º-C da LTC, seja na sua génese (e nas finalidades que presidiram à respetiva estatuição), seja na assinalada evolução do quadro normativo vigente em matéria de regulação dos partidos políticos, dificilmente se entende poder a mesma ser aplicada no caso vertente, o qual não encontra resposta nos limites da letra e do espírito da norma invocada. Assim, no quadro de «intervenção mínima» do Tribunal Constitucional – já mencionado – e na visão sistémica do atual enquadramento legal dessa mesma intervenção, a pretensão dos impugnantes de verem apreciada a validade e regularidade do ato eleitoral em causa diretamente pelo Tribunal Constitucional, prevalecendo-se de uma interpretação extensiva do n.º 7 do artigo 103.º-C da LTC e da aplicação das regras aqui contidas em matéria de prazo de impugnação não se mostra procedente. Conclui-se ainda, e na sequência do que fica exposto, que da lei não se retira que as vicissitudes de funcio- namento do competente órgão jurisdicional interno possam ser invocadas como circunstâncias justificativas do

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