TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

694 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL verdade, o respetivo exercício fica dependente de uma conduta vigilante dos sujeitos potencialmente afetados pela concessão ou registo de AIM, sem a qual o titular da patente pode ver caducar o direito a intentar a ação arbitral. Resta saber, assim, se esta restrição se conforma com o regime jurídico-constitucional das restrições aos direitos, liberdades e garantias: dirigir-se à salvaguarda de outro interesse ou direito constitucionalmente protegido, subordinar-se ao princípio da proporcionalidade, e constar de lei geral e abstrata, com efeitos não retroativos (artigo 18.º, n. os  2 e 3, da Constituição). In casu , não se colocam dúvidas quanto à autorização constitucional nem quanto à sua justificação na salvaguarda de outro direito ou interesse constitucionalmente protegido, porquanto o regime em causa se dirige a evitar uma morosa discussão sobre a eventualidade de direitos que impedissem a introdução dos medicamentos genéricos, colocando em cheque a criação de condições para o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de saúde, materializando o direito à saúde e ao acesso a medicamentos a custos comportáveis [alínea a) do n.º 3 do artigo 64.º da Constituição]. Foi essa a motivação invocada pelo legislador quando, na expo- sição de motivos da proposta de lei que conduziu ao diploma ora analisado, lembrou que “tem vindo, assim, a assistir-se a um vasto conjunto de litígios judiciais a respeito da concessão da autorização de introdução no mercado [...] relacionados com a subsistência de direitos de propriedade industrial a favor de outrem”, pelo que o interesse público de disponibilização de medicamentos genéricos conduziu ao estabelecimento de um “mecanismo alternativo de composição de litígios que, num curto espaço de tempo, profira uma decisão de mérito quanto à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial” (cfr. Proposta de Lei n.º 13/XII), justificando-se aí que o próprio tempo de reação e demanda se conte imediatamente, a partir da publicitação do pedido ou do registo da AIM. O problema mais delicado radica em saber se a restrição colocada no acesso ao mecanismo arbitral necessário, ao determinar um ónus de conduta sobre os titulares de direitos de propriedade industrial, obe- dece ao cumprimento do princípio da proporcionalidade, na sua tripla dimensão (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito). Há que indagar se a medida restritiva tende aos fins visados pela compressão (a salvaguarda de outros interesses constitucionalmente protegidos); se a medida é necessária, não havendo outros mecanismos menos restritivos que realizassem aquele mesmo objetivo; e se o juízo de ponderação entre o sacrifício imposto e o benefício por ele obtido se tem por razoável. No que concerne à adequação ou idoneidade, não parecem concitar-se dúvidas: é inequívoco que a contagem do prazo de ação arbitral a partir do momento da publicitação da AIM do medicamento genérico eventualmente incompatível com um direito de patente ou de certificado complementar de proteção tem por efeito uma maior celeridade na conclusão daquele litígio face a um sistema que espoletasse o decurso do prazo com o seu conhecimento efetivo. Constitui assim um mecanismo apto à persecução do interesse público constitucionalmente relevante de introdução no mercado de medicamentos genéricos, socializando os custos dos cuidados de saúde e alargando por isso o seu acesso (artigo 64.º da Constituição). Já o subprincípio da necessidade ou exigibilidade impõe que a medida restritiva seja, de todos os meios aptos ao fim prosseguido, a menos onerosa para os direitos, liberdades e garantias: “o centro das preocupações desloca-se para a ideia de comparação. [...] Na máxima da necessidade a operação central é a comparação entre uma medida idónea e outras medidas também idóneas. [...] O objetivo de tal comparação será a escolha da medida menos lesiva. Do ponto de vista do princípio da proporcionalidade, medida necessária é a medida menos lesiva” (Vitalino Canas, “Proporcionalidade, Princípio da”, in Dicionário Jurídico da Administração Pública , 1994, p. 624). Em consequência, o cânone depende da conclusão de que a modelação da medida não poderia deixar um maior espaço de ação do direito fundamental sem beliscar a eficácia da medida res- tritiva; requer, em consequência, que o âmbito material, espacial, temporal e pessoal da compressão seja o menor possível para alcançar os efeitos positivos da limitação (Jorge Miranda e Rui Medeiros, cit. , p. 375). Nesta conformidade, há que olhar ao âmbito de aplicação da medida – o universo de sujeitos sobre que impende o ónus de consulta da página eletrónica do Infarmed – e indagar se tal corresponde ao campo de ação necessário para imprimir celeridade na solução dos litígios em causa, devendo concluir-se pelo caráter

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