TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

69 acórdão n.º 225/18 8. Quaisquer intercorrências de saúde ocorridas na gestação (a nível fetal ou materno) serem decididas exclusi- vamente pela gestante de substituição com o apoio de equipa multidisciplinar de saúde; 9. Caber ao casal beneficiário, em conjunto com a gestante de substituição, decidir a forma de amamentação (devendo, em caso de conflito, prevalecer a opção do casal beneficiário); 10. Ser legalmente inaceitável a existência de uma relação de subordinação económica entre as partes envolvi- das na gestação de substituição 11. O contrato sobre a gestação de substituição (celebrado antes da gestação) não poder impor restrições de comportamentos à gestante de substituição (tais como condicionamentos na alimentação, vestuário, profissão, vida sexual); 12. O embrião transferido para a gestante de substituição ter como progenitores gaméticos, pelo menos, um dos elementos do eventual casal beneficiário; 13. A lei sobre esta matéria e sua regulação complementar serem obrigatoriamente reavaliadas três anos após a respetiva entrada em vigor. No Parecer 87/CNEVC/2016, contudo, o CNEVC não considerou que a iniciativa que lhe foi presente reu- nisse as referidas condições mínimas que, em seu entender, permitem revogar a proibição da gestação de substi- tuição. Com efeito, e em sede de enquadramento ético da gestação de substituição, o CNEVC chamou a atenção para o facto de, residindo a diferença fundamental entre a gestação de substituição e as demais técnicas de procriação na utilização do corpo de outra mulher que não a beneficiária, ainda subsistirem interrogações éticas ao nível do «respeito pela dignidade da gestante, da instrumentalização do seu corpo, da quebra da ligação entre gestação, maternidade e paternidade, bem como na realização do superior interesse do nascituro e da criança» [Parecer n.º 87/CNEVC/2016]. As preocupações do CNEVC condensam-se nas seguintes interrogações: – O contrato de gestação de substituição articula-se adequadamente com os direitos da mulher gestante, nomeadamente, precavendo-a da possibilidade de exploração da mesma? – O contrato de gestação de substituição protege adequadamente os direitos da criança que vier a nascer, num contexto reprodutivo novo, no que respeita à construção da personalidade da criança? – É aceitável que a lei imponha o cumprimento de um contrato que representa o corte com o vínculo biológico e afetivo que se consolida durante o desenvolvimento intrauterino da criança, que a ciência já demostrou ser imprescindível a um adequado e saudável processo de crescimento e de desenvolvimento bio/psico/social da mesma? – É ética e moralmente aceitável que a lei nada disponha sobre a relação de filiação desta criança em caso de incumprimento das condições do contrato, remetendo toda essa problemática para o regime geral da nulidade do contrato? Será esta matéria passível de ser legislada noutro instrumento legal que não este? Em consequência destas e de outras dúvidas, acabou o CNEVC por concluir que as iniciativas legislativas que viriam a dar origem à Lei n.º 25/2016, de 22 de agosto, além de não salvaguardarem adequadamente os direitos da criança a nascer nem os da mulher gestante, não previam igualmente um adequado enquadramento do contrato de gest[aç]ão. Além disso, não asseguravam o cumprimento das condições 1.ª, 2.ª, 3.ª, 8.ª e 11.ª, definidas no Parecer 63/CNEVC/2012. É certo que, na sequência da devolução do Decreto à Assembleia da República pelo Senhor Presidente da República, cuja mensagem remetia precisamente para as dúvidas suscitadas neste Parecer, foram-lhe introduzidas alterações, que em nosso entender, de resto, continuam a não dar uma resposta cabal às observações do CNECV – nem a lei o faz, nem a regulamentação que ainda se aguarda o poderá fazer, porque muitas delas são pura e simples- mente impossíveis de atender e as múltiplas dúvidas e questões que ainda se colocam não têm uma resposta exata, inequívoca e cientificamente comprovada, tal como o exige a defesa do superior interesse da criança e o primado da dignidade humana.»

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