TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
689 acórdão n.º 187/18 Na expressão do Acórdão n.º 350/12: «(...) [O] direito de acesso aos tribunais para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos e obtenção de uma sua tutela jurisdicional, plena e efetiva, constituiu um direito ou garantia fundamental que se encontra consagrada no art.º 20.º da Constituição. Mas daí não decorre que seja um direito absoluto, de uso incondicio- nado. Desde logo, ele consente as restrições que caibam nos parâmetros estabelecidos nos n. os 2 e 3 do art.º 18.º da CRP. Por outro lado, decorre da própria previsão constitucional que a tutela jurisdicional dos direitos e interesses legalmente protegidos seja efetuada “mediante um processo equitativo” e cujos procedimentos possibilitem uma decisão em prazo razoável e sejam “caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos” que esse direito, além do mais, está sujeito a regras ou condicionamentos procedimentais e a prazos razoáveis de ação ou de recurso. Ponto é que esses condicionamentos, pressupostos e prazos não se revelem desnecessários, desadequados, irra- zoáveis ou arbitrários, e que não diminuam a extensão e o alcance do conteúdo desse direito fundamental de acesso aos tribunais (Acórdão n.º 178/07).» 11. Como se disse, o âmbito da tutela jurisdicional aqui em discussão inscreve-se no mecanismo de arbitragem necessária instituído pelo legislador através do Decreto-Lei n.º 62/2011 para dirimir litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautelares, rela- cionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos, tal como definidos pelo RJMUH. Trata-se, pois, da tutela jurisdicional dirigida à proteção de direitos de propriedade industrial que, em si mesmos, encontram abrigo constitucional. Com efeito, o direito de propriedade constitui direito fundamental a que é reconhecida natureza aná- loga aos direitos, liberdades e garantias, gozando por isso de aplicabilidade direta e de um regime específico na sua restrição (cfr. artigo 62.º da Constituição). Acresce que é entendimento pacífico na jurisprudência deste Tribunal que o conceito da propriedade e respetivo âmbito de proteção constitucional não coincidem com a sua conceção civilística, como esclarecem Gomes Canotilho/Vital Moreira, cit. , p. 800, e foi já deci- dido no Acórdão n.º 491/02: «Resulta, assim, claro que o direito de propriedade a que se refere aquele artigo da Constituição não abrange apenas a proprietas rerum , os direitos reais menores, a propriedade intelectual e a propriedade industrial, mas também outros direitos que normalmente não são incluídos sob a designação de «propriedade», tais como, designadamente, os direitos de crédito e os “direitos sociais” – incluindo, portanto, partes sociais como as ações ou as quotas de sociedades». Assim, no seu âmbito encontram-se os direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos, sejam eles patentes de invenções de produto, de processo ou de uso, seja sob a forma de patente ou de cer- tificado complementar de proteção (enquanto título que prolonga a eficácia do direito de patente, embora apenas para os concretos usos fixados na AIM – cfr. Remédio Marques, «O objeto e o âmbito de proteção do certificado complementar de proteção para medicamentos de uso humano: jurisprudência e tendências recentes», in Actas de Derecho Industrial y Derecho de Autor, Vol. 32, 2011-2012, p. 292). Em qualquer caso, são direitos que pretendem dar ao titular um direito exclusivo de exploração, impedindo qualquer utilização comercial não autorizada ou consentida pelo seu titular (Vieira de Andrade, “A proteção ...”, cit. , p. 73). É aliás assim que a lei ordinária dá cumprimento ao comando constitucional, ao acolher como patente o “direito exclusivo de explorar a invenção em qualquer parte do território português” conferindo “ainda ao seu titular o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a intro- dução no comércio ou a utilização de um produto objeto de patente, ou a importação ou posse do mesmo, para alguns dos fins mencionados” [artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial (CPI)]. Nestes termos, é constitucionalmente protegida a exclusividade de exploração comercial ou industrial, pelo que a autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos deve garantir a tutela dos direitos de propriedade industrial garantidos pela Lei Fundamental.
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