TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
666 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL –, a norma constante do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013 veio fixar uma solução que não era de todo extraível, sequer como um dos seus possíveis sentidos, da lei anterior, constituindo, por isso, direito novo. Com efeito, ali se prescreve a aplicação dos novos pressupostos da isenção em matéria de IMT e de Imposto do Selo, resultantes do aditamento ao artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH dos seus atuais n. os 15 a 17 – a celebração de contrato de arrendamento para habitação permanente dentro dos três anos subsequentes ao momento do ingresso do imóvel adquirido no património do fundo e a conser- vação do imóvel na propriedade do fundo dentro do mesmo prazo –, às aquisições realizadas sob a vigência da Lei n.º 64-A/2008, estipulando-se concomitantemente, ainda que para o futuro, um prazo dentro do qual tais pressupostos carecem de ser preenchidos sob pena de caducidade do benefício. O segundo aspeto a clarificar prende-se com a estrutura do evento tributário atingido retroativamente pela lei nova. Este, conforme visto já, é integrado pelo facto jurídico sujeito a IMT e a Imposto do Selo – aquisição do direito de propriedade de bens imóveis –, e pela condição aposta às isenções fiscais legalmente previstas – destinação do imóvel adquirido exclusivamente a arrendamento para habitação permanente. Enquanto o primeiro, surgindo isolado no tempo, é de verificação instantânea – é o que decorre do facto de os impostos sobre o património serem impostos de obrigação única –, a segunda tinha, já no âmbito da Lei n.º 64-A/2008, não apenas natureza resolutiva, como caráter prospetivo: se, em momento subsequente à respetiva aquisição pelo fundo, o imóvel adquirido não viesse a ser disponibilizado para arrendamento habitacional, o benefício caducaria, ressurgindo a obrigação tributária. Uma vez que, no âmbito da Lei n.º 64-A/2008, o pressuposto integrativo da condição resolutiva aposta aos benefícios se projetava já necessariamente para o futuro, não é possível afirmar, através da mera análise dos dados normativos relevantes, que a norma constante do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013 atinja factos completados ao abrigo da lei anterior e seja, por isso, autenticamente retroativa. Tal conclusão pressuporia que o facto jurídico-tributário, globalmente considerado, se pudesse dizer integralmente ocor- rido ao abrigo da lei antiga (a Lei n.º 64-A/2008), o que, em face do caráter prospetivo da condição resolu- tiva aposta ao benefício, não pode, conforme se viu, ser afirmado, pelo menos com a segurança necessária ao reconhecimento do desvalor constitucional correspondente à violação da proibição das leis fiscais retroativas, consagrada no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição. 16. A conclusão de que a norma constante do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013 não é, pelo menos com evidência pressuposta pelo acionamento da proibição consagrada no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição, autenticamente retroativa, não é suficiente, porém, para concluir pela respetiva conformidade constitucional. E isto porque, nos casos de retroatividade inautêntica ou imprópria – isto é, os respeitantes a normas que preveem, de forma inovadora, consequências jurídicas para situações que se constituíram antes da sua entrada em vigor, mas que se mantêm (ou podem manter-se) nessa data –, tem este Tribunal reiteradamente sublinhado que, também no âmbito tributário, as mutações da ordem jurídica não podem atingir as expeta- tivas criadas ao abrigo da lei antiga em termos incompatíveis com aquele mínimo de certeza e de segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição. Tal entendimento, que coloca sob incidência dos limites decorrentes do princípio da proteção da con- fiança as situações de retroatividade inautêntica, foi sintetizado no Acórdão n.º 128/09, já referido, onde a tal propósito se escreve do seguinte: «Conforme sublinhado na jurisprudência constitucional, a proibição expressa da retroatividade da lei fiscal não tornou inútil a eventual aplicação, a matérias de natureza tributária, do parâmetro da proteção da confiança. Como diz Casalta Nabais, (Cfr. Direito Fiscal , 3.ª edição, Almedina, Coimbra, p. 149) a proteção da confiança não foi absorvida pelo novo preceito constitucional. Ao textualizar a proibição de normas fiscais retroativas, a Constituição
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