TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
663 acórdão n.º 175/18 elemento sistemático da interpretação, a conclusão de que, ao empregar o termo “destinar” nas formulações insertas na Lei n.º 64-A/2008, o legislador teria pretendido excluir o sentido que adviria de uma eventual replicação do conceito de “afetar”, constante já daquela disposição. Ou, mais explicitamente ainda, de que, no pensamento unitário do legislador fiscal, contemporâneo da publicação da Lei n.º 64-A/2008, “destinar” e “afetar” correspondessem a conceitos de conteúdo diverso nos termos em que essa diversidade lhes foi apontada pelo tribunal a quo. O segundo argumento invocado na sentença recorrida prende-se com o sentido das alterações levadas a cabo pela Lei n.º 83-C/2013: ao impor, nos novos n. os 15 e 16 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, um «prazo dentro do qual a mudança de destinação do imóvel implica também a perda da isenção», o legislador terá reconhecido que, «na ausência de tal prazo, a mudança de destinação não implicaria a perda da isenção». Ora, da imposição a posteriori de um prazo dentro do qual a alteração do destino legalmente fixado para o imóvel implica a caducidade do benefício não pode inferir-se, a contrario , que, na ausência de tal prazo, a não afetação pura e simples do imóvel àquele fim não implicasse a perda da isenção. Trata-se aqui de um non sequitur, já que uma coisa não decorre necessariamente da outra. O estabelecimento de um prazo dentro do qual o imóvel adquirido terá de ser efetivamente arrendado sob pena de caducidade das isenções – é o que decorre dos n. os 14 e 15, aditados pela Lei n.º 83-C/2013 ao artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH – não significa que, no âmbito da Lei n.º 64-A/2008, a disponibilização do imóvel para aquele fim não integrasse já a condição aposta ao benefício; significa sim que, em todos os casos em que o contrato de arrendamento não venha a ser efetivamente cele- brado dentro daquele prazo, ainda que por causa não imputável ao fundo, o benefício caduca, renascendo a correspondente obrigação tributária. Do mesmo modo, também o estabelecimento de um prazo dentro do qual o imóvel adquirido pelo fundo não pode ser alienado sob pena de caducidade das isenções – é o que estabelece o n.º 16 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, na versão resultante das alterações introduzidas pela Lei n.º 83-C/2013 –, não significa que a efetiva colocação do prédio no mercado de arrendamento habitacional não fosse já legalmente exigida; significa sim que, mesmo que o imóvel haja sido efetivamente disponibi- lizado para arrendamento habitacional, o fundo é obrigado a conservar a propriedade do imóvel durante aquele prazo, ainda que a celebração efetiva do contrato de arrendamento se haja frustrado por razões atinen- tes à retração do próprio mercado e, portanto, por causas que lhe não sejam imputáveis. Em suma: mesmo atentando nos argumentos invocados na sentença recorrida, encontramo-nos longe de poder afirmar com segurança que o pressuposto de aplicação da norma excecional isentiva – destinação do imóvel a arrendamento para habitação permanente – tinha, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008, a mesma natureza instantânea que o ato de aquisição do imóvel; o conjunto de elementos acima considerados aponta, ao invés, para a conclusão de que se tratava, já então, de um facto tributário complexo de formação sucessiva, que apenas se completava com a efetiva disponibilização do imóvel adquirido para a finalidade estabelecida no âmbito da condição aposta ao benefício. 14. A razão pela qual se impõe proceder aqui à exata caracterização do pressuposto que integra a condi- ção aposta aos benefícios ficais consagrados no artigo 8.º, n.º 7, alínea a) , e n.º 8, do Regime jurídico aplicá- vel aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008, prende-se com a relevância da estrutura do facto tributário em face da proibição da retroatividade fiscal, consagrada no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Até à explicitação no texto da Constituição da proibição da retroatividade em matéria fiscal, levada a cabo no âmbito da revisão no âmbito da revisão constitucional de 1997, o Tribunal Constitucional vinha aferindo a constitucionalidade das leis fiscais retroativas com recurso ao método de ponderação inerente ao controlo da constitucionalidade das leis baseado no princípio da proteção da confiança. No desenvolvi- mento da orientação fixada no Parecer da Comissão Constitucional n.º 25/81 ( Pareceres da Comissão Cons- titucional, 16.º Vol., p. 257), firmou-se na jurisprudência constitucional o entendimento segundo o qual
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