TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

661 acórdão n.º 175/18 o prédio adquirido a esse fim, de tal modo que, uma vez declarada essa intenção, se pode dizer que aquela condição se cumpriu e o evento tributário se completou? Logo do ponto de vista da letra da lei (elemento literal), é possível sustentar-se a conclusão inversa: ao dispor que ficam isentas de IMT e IMI as aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos, quando realizadas pelos fundos, desde que destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, o legislador terá sujeitado a atribuição do benefício fiscal à efetiva disponibilização do imóvel adquirido para esse exclusivo fim e, como tal, a uma condição resolutiva cujo pressuposto se projeta necessariamente para além no momento em que tem lugar o facto tributário. É esse o sentido para que aponta o emprego do verbo destinar, que significa determinar antecipadamente o fim a dar a algo. Comportando uma dupla dimensão – subjetiva e objetiva –, a destinação implicada na condição aposta ao benefício tenderá a supor, a par da manifestação de uma vontade de correspondente sentido, a adoção de um comportamento revelador da vinculação do imóvel adquirido ao fim legalmente prescrito. Tal conclusão parece sair reforçada ao encararmos o enunciado pela negativa, isto é, a partir das situa- ções em que o mesmo se poderá dizer desatendido ou inobservado: linguisticamente, a obrigação de destinar exclusivamente um imóvel para arrendamento habitacional não poderia deixar de ter-se por prima facie violada caso o imóvel, em ato consecutivo ao da sua aquisição, fosse, por exemplo, alienado ou dado de arrendamento comercial; neste caso, estar-se-ia a dar ao prédio adquirido um destino diverso daquele que é imposto legalmente – e fora declarado – ao imóvel. Mais decisivo do que elemento linguístico é, porém, o elemento racional ou teleológico – isto é, aquele que, na determinação do sentido do enunciado legal, manda atender à finalidade prosseguida pela norma interpretanda, isto é, à sua razão de ser ( ratio legis ). Sabendo-se que a clarificação do espírito da lei que institui determinado regime não passa sem a iden- tificação das situações a que a mesma procurou dar resposta (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Direito , Coimbra: Almedina, 2012, pp. 366 e seguintes), é altura de retomar aqui o que ficou já dito a propósito das razões subjacentes à criação do regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, em especial no âmbito tributário: tratou-se da consagração de um conjunto de benefícios fiscais destinados a incenti- var investidores privados a, mediante a criação de fundos imobiliários, adquirir, para ulterior colocação no mercado de arrendamento, imóveis particulares cuja compra fora financiada através do recurso ao crédito à habitação, de forma a dar resposta à situação de um amplo conjunto de famílias que, no contexto da crise económico-financeira iniciada em 2008, haviam deixado de conseguir suportar o pagamento das corres- pondentes prestações, proporcionando-lhes, assim, a possibilidade de alienar as respetivas frações ao fundo, mantendo, ao mesmo tempo, a disponibilidade sobre o imóvel mediante a celebração, por renda de valor inferior ao daquelas prestações, de contratos de arrendamento com os fundos adquirentes. Aqui residindo o ponto de referência do regime tributário instituído no artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, aprovado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, duas conclusões parecem-se impor-se desde já, com evidência, pelo menos, suficiente para afastar a possibilidade de ter por certa a carac- terização como um facto instantâneo – e, por isso, integralmente pretérito – do evento tributário em causa nos presentes autos. A primeira é a de que os benefícios fiscais consagrados naquele artigo 8.º são, não estáticos, mas dinâ- micos, no sentido em que visam incentivar a prática do sucessivo conjunto de atos que integram o iter neces- sário à colocação no mercado de arrendamento habitacional de frações adquiridas pelos fundos imobiliários para esse fim, através do estabelecimento entre as vantagens fiscais em cada momento atribuídas e a atividade em concreto estimulada de uma relação de causa-efeito. A segunda é a de que, no que toca aos benefícios consagrados na alínea a) do n.º 7 e no n.º 8 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro – isenções de IMT e Imposto do Selo –, a causa do benefício só pode residir na efetiva disponibilização do imóvel adquirido para arrendamento habitacional.

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