TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

646 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL na sequência de tal recusa, condenou a Fazenda Pública no pedido de anulação das liquidações do imposto formulado nos autos. 2. No segmento que releva para a apreciação do presente recurso, consta da sentença recorrida a seguinte fundamentação: «12. Face a este quadro legislativo a questão jurídica que cumpre solucionar é a de saber se, à luz do n.º 2, do art. 236.º, da lei 83-C/2013, de 31 de dezembro e dos n. os 14.º, 15.º e 16.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezem- bro, na redação conferida por aquele diploma, a aquisição do imóvel em causa, ocorrida antes de 1 de janeiro de 2014, pode ser tributada por o imóvel ter sido vendido antes de decorrido o prazo de três anos contados a partir de 1 de janeiro de 2014 e, por outro lado, em caso afirmativo, se tal solução legal é conforme com o art. 103.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, que determina que “Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos (…) que tenham natureza retroativa (…)” 13. É indubitável que, face às normas ordinárias transcritas, um Fundo de investimento imobiliário para arrendamento habitacional que, a partir de 1.01.2014, venda um imóvel adquirido em ano anterior, que tenha beneficiado de isenção por o imóvel ter como destino o arrendamento para habitação permanente e que o venda antes de decorridos 3 anos após 1.01.2014, fica sujeito a imposto por força da lei 83-C/2013, de 31 de dezembro. Note que no caso sub judice , o facto tributário em causa (a aquisição da propriedade por parte do Requerente) verificou-se inteiramente ao abrigo da lei antiga. É também indubitável que o facto tributário em causa é sujeito a tributação face à lei 83-C/2013, de 31 de dezembro, mas não o era face à Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, na sua redação originária. 14. Escreve Sérgio Vasques que “A consagração da proibição expressa do art. 103.º, n.º 3, da Constituição da República, serve essencialmente para deixar claro que a retroatividade, forte ou fraca, está por princípio, vedada ao legislador fiscal, que só poderá socorrer-se dela a título excecional. Em face do art. 103.º, n.º 3, da CRP, uma lei fiscal retractiva afigurar-se-á sempre, e à partida, lei inconstitucional, não sendo necessária qualquer ponderação casuística para se chegar a esta primeira conclusão. Mas isto não obsta a que, num segundo momento, concluamos que a segurança jurídica deve [ser] sacrificada a outros valores constitucionais que no caso concreto se mostrem mais relevantes e que em circunstâncias excecionais se considere legítima a lei fiscal retractiva, como pode acontecer em caso de guerra, catástrofe natural, epidemia ou grave crise financeira”. Ainda na doutrina, diz-nos Ana Paula Dourado “Nos casos dos impostos de obrigação única (por exemplo, a compra e venda de um imóvel, sujeito a IMT) a proibição da retroatividade implica o respeito pelos factos tributá- rios passados, ou seja a não aplicação da lei nova a esses factos, pois a obrigação tributária nasceu e está concluída.” 15. Em linha com a qualificada doutrina acabada de referir, poder ler-se no acórdão n.º 617/2012, de 19 de dezembro de 2012, Processo n.º 150/12, do Tribunal constitucional: “Com efeito, o facto gerador da obrigação fiscal (…) ocorre indubitavelmente antes da publicação da lei nova, não sendo possível entender que se está perante um facto jurídico fiscal complexo de formação sucessiva. A aplicação da nova lei a este facto ocorrido anteriormente à sua aprovação envolve, pois, uma retroatividade autêntica. O que releva, face aos princípios constitucionais enunciados, não é o momento de liquidação de um imposto, mas sim o momento em que ocorre o ato que determina o pagamento desse imposto. É esse ato que vai dar origem à constituição de uma obrigação tributária, pelo que é nessa altura, em obediência ao princípio da legalidade, na vertente fundamentada pelo princípio da proteção da confiança, que se exige, como medida preventiva, que já se encontre em vigor a lei que prevê a criação ou o agravamento desse imposto, de modo a que o cidadão possa equa- cionar as consequências fiscais do seu comportamento. (…) Ora, tendo já ocorrido o facto que deu origem à obrigação tributária posteriormente agravada por lei nova, as razões que presidiram à consagração da regra de proibição da retroatividade neste domínio estão integralmente

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